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MOTELX. ‘Holy Spider’ é um noir dos antigos com temas bem modernos

Nesta quarta-feira (7), o Cinema São Jorge voltou a acolher os amantes do cinema de terror nas suas salas, algo que vai acontecer até ao próximo dia 12. Com um cartaz variado, com filmes para todos os gostos, o destaque do dia vai para a exibição de Holy Spider, um thriller iraniano que tem andado nas bocas do mundo desde a sua estreia no consagrado Festival de Cannes.

Numa sala a abarrotar pelas costuras, Holy Spider foi exibido pouco tempo depois da sessão que mostrou Enemy, o famoso filme de Denis Villeneuve quando este ainda fazia “pequenos” projetos independentes, sendo um dos muitos thrillers psicológicos presentes neste certame, tendo sido mostrado ao público de forma a celebrar José Saramago, que faria 100 anos neste presente ano e, acima de tudo, escreveu o livro no qual Villeneuve se inspirou para Enemy.

No entanto, o público estava ali para ver Holy Spider, um filme bem radical para aquilo que o Irão nos vem mostrando, na onda do que Asghar Farhadi, talvez o cineasta mais famoso desse país, tem feito. Neste filme, realizado por um Ali Abassi sem qualquer tipo de medo ou receio de chocar o espetador, não fosse ele um talento com origem no género do terror, temos Rahimi, interpretada por Zar Amir Abrahimi, uma jornalista que decide investigar o assassinato de várias mulheres no submundo de Masshad, uma autêntica cidade fantasma no meio do Irão. Estas mulheres, prostitutas, vem sendo levadas uma a uma para a sua morte por um homem misterioso, intitulado pela imprensa como “The Spider Killer”.

Inspirado numa história real que assombrou as ruas daquele pais no início do séc. XXI, Holy Spider tem sempre um toque diferente daquilo que nos é mostrado no cinema do país. O seu prólogo, uma cena de arrepiar até os mais fortes, é repleto de nudez, cenas sexuais explícitas e violência bastante gráfica, deixa dúvidas para o local em que isto possa ter sido filmado, já que é uma produção conjunta de Dinamarca, Alemanha, Suécia e França, mas a narrativa é toda filmada na Jordânia.

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A moralidade religiosa

O Spider Killer, um papão que assombrou as ruas de Masshad entre 2000 e 2001, tem raptado e assassinado as mulheres que vê a trabalhar na praça principal da cidade, justificando isto com valores religiosos e familiares, o que acaba por ser um dos grandes temas deste filme. Religião é um autêntico saco de pancada em filmes do Médio Oriente, mas poucos a ridicularizaram e questionaram a sua hipocrisia como Holy Spider teve a coragem de fazer.

O filme é passado em duas perspetivas. Uma é a investigação de Rahimi e a outra é a perspetiva de Saeed, o tal serial killer, que vemos a brincar com a família como se nada fosse, enquanto comete todo o tipo de atrocidades que justifica com a sua fé. No entanto, Saeed começa a entrar num ponto de rutura, fazendo com que a sede de matar comece a apoderar-se dele, acabando por dificultar a tentativa de ser um pai e marido completamente normal.

Enquanto que esta parte da história dá panos para mangas, a perspetiva de Rahimi acaba por ser muito mais profunda naquilo que tenta dizer. Afinal de contas, ela é uma mulher numa sociedade como a do Irão e, acima de tudo, uma que nunca se cala e não está para aturar tudo o que lhe aparece à frente. O mote de resolver todo o mistério vem dela mas com isso veio a dúvida: será que esta gente quer mesmo castigar um assassino que matou mulheres com a justificação que não são puras o suficiente?

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Há pontos do filme que lhe dão razão, e não são nada poucos. Quando o assassino é descoberto, algo que aconteceu anormalmente rápido para um filme deste género, Saaed é visto como um herói pela sociedade iraniana, tendo multidões a apoiá-lo e a suplicar pela sua libertação. No meio disto tudo, o filme consegue deixar a dúvida se este homem, que assumiu todos os homicídios pelo qual foi acusado, vai ser realmente julgado e castigado, o que acaba por ser um tanto inacreditável sabendo que foi algo inspirado numa situação real.

No entanto, enquanto Holy Spider acerta em todos os pontos possíveis em termos da sua mensagem e dos seus temas, erra a espaços no que toca à sua execução, já que a primeira parte da história, a tal investigação, teria beneficiado se fosse, lá está, uma investigação mais agressiva do que aquilo que é mostrado. Filmes com jornalistas tem sempre o condão para deixar o espetador com o nervoso miudinho e, em Holy Spider, isso falha aqui e ali. Nada de muito especial, mas é o que acaba por fazer com que os 117 minutos desta longa metragem sejam sentidos a dado ponto.

A força deste filme acaba por ser mesmo toda a moral à volta dele, e a sua respetiva hipocrisia. Toda a roda familiar de Saaed pouco se importa com o que ele fez, e a cena final, com o seu filho a fazer uma reconstituição dos metódos do pai promete ficar gravada na cabeça de quem o vê durante imenso tempo, sendo o prego final de uma mensagem que chegou à nossa mente de forma lenta e corajosa. Apesar de não ser o melhor filme de sempre, promete não deixar ninguém indiferente.

Holy Spider é um dos vários filmes em competição no MOTELX, Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, que se realiza até ao próximo dia 12 no Cinema São Jorge, em Lisboa.

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