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Sessão de abertura do 16º MOTELX - Divulgação Facebook

O MOTELX começou com o terror cómico da estupidez juvenil

'Bodies, Bodies, Bodies' foi o filme escolhido para a abertura da 16ª edição do MOTELX, que se prolonga até 12 de setembro

Esta terça-feira (6) o Cinema São Jorge esgotou a sua lotação para receber os amantes do cinema de terror para a 16ª edição do consagrado festival português. Bodies Bodies Bodies da realizadora holandesa Halina Reijn foi o filme escolhido para esta edição do MOTELX, que comemora também o regresso a todas as atividades, depois de dois anos de restrições.

Foram muitos aqueles que quiseram estar presentes no lançamento da 16ª edição do Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa e com a hora de atraso que decorreu da enchente no Cinema São Jorge, era claro o entusiasmo da plateia quando terminaram os discursos de apresentação e teve lugar aquele que é um dos filmes mais esperados do cartaz de 2022, após a estreia consagrada no festival americano South by Southwest.

Bodies Bodies Bodies – é este o ponto a que chegamos?

Entre pequenos sustos e grandes gargalhadas, a sala Manoel de Oliveira do Cinema São Jorge, sem um lugar livre, não ficou indiferente a este filme que ainda não tem para já em vista uma estreia nas salas de cinema portuguesas e que teve aqui uma exibição única e inédita.

É fácil de nos identificarmos com a história, nem que seja pelos retratos e preconceitos geracionais que vamos ouvindo a cada canto, Sophie (Amandla Stenberg) e a namorada Bee (Maria Bakalova) viajam até à mansão de David (Pete Davidsonn), perdida no meio de uma floresta, em noite que anunciava tempestade, transformada por estes amigos numa “hurricane party”. Na casa estão já Jordan (Myha’la Herrold), a namorada de David, Emma (Chase Sui Wonders) e Alice (Rachel Sennott), com o namorado Greg (Lee Pace), que conhecera há quinze dias e que pela diferença de idades surge logo como a personagem mais surreal e apontada como culpada por todos os acontecimentos estranhos.

Álcool, drogas e anti depressivos são o menu desta festa íntima de amigos que ganha novos contornos com o início da tão anunciada tempestade. E com ela chegam também todos os clichés que nada mais são que verdades e reflexo de uma juventude problemática, viciada em redes sociais e crente de que conhece todas as causas e bandeiras para a emancipação de minorias e capaz de fazer as mais profundas avaliações psicológicas.

O filme, dirigido por Halina Reijn e escrito por Sarah DeLappe apresenta claramente um roteiro feminino, refletindo em rigor aquelas que são as conversas e relações entre amigas, principalmente através da personagem mais marcadamente cómica, a Alice, que roubou várias gargalhadas ao público durante toda a exibição.

Com uma escrita cómica e brilhantemente perspicaz, surpreende-nos do princípio ao fim, fugindo de todos os momentos que pensamos conseguir adivinhar e terminando de uma forma que seria má de mais para imaginarmos.

Com o passar da noite, e com a tempestade a agravar-se cada vez mais, o famoso jogo Body Body,  e uma falha de eletricidade conduzem toda a festa ao colapso. A estupidez da juventude começa logo na escolha da brincadeira, muito famosa nos núcleos americanos, na qual os jogadores se escondem num quarto escuro enquanto o assassino os “mata” tocando neles, vencendo se conseguir matar o grupo inteiro. Aqui o terror – ou mais uma vez a estupidez e o descontrole – começam quando as palavras ganham força e os mortos e assassinos se tornam reais.

O cinema de género sempre foi perspicaz em críticas à sociedade e sempre foi muito mais além daquilo a que por vezes reduzimos o cinema de terror e aqui somos conduzidos a uma crítica primorosa à geração Z, ou pelo menos aquilo que pensamos dela. Nem o vet (veterinário confundido com veterano) Greg escapa à crítica geracional, por mais que já não tenha idade para pertencer a essa mesma designação.

No decorrer da ação, e sempre bem articulado, surgem pequenos apontamentos sobre o porte de armas, o consumo de drogas e as festas juvenis americanas que estamos habituados a ver representadas há décadas no grande ecrã.

No final tudo se prova ser um mau entendimento do que os rodeia, capazes de achar que conhecem todos os meandros e toda a profundidade de cada “amigo”, quando no fundo mantém apenas relações superficiais. Há a crítica aos amigos que colocam Sophie à frente de todos os consumos quando se encontra em recuperação de adição, há a crítica a amores profundos e considerados longos à segunda semana, por Alice e o seu relacionamento com Greg e há um constante uso, apesar de muito bem estruturado e sem cair no exagero, de como todas as decisões são comandadas pela adição às redes sociais.

Não sabemos dizer se estamos de facto assim tão perdidos, mas o que é certo é que este Bodies Bodies Bodies fez uma plateia sentir-se identificada e a rir do princípio ao fim, sentindo-se superior a julgar aquilo que de facto se calhar todos nós já vivemos ou vimos fazer.

Foi uma sessão de abertura que prova que o MOTELX, Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa está vivo e de boa saúde e vai continuar até 12 de setembro.

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