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MOTELX - Lançamento do Livro 'O Quarto Perdido MOTELX' - Divulgação Facebook MOTELX

Os Filmes do Terror Português em livro e em exibições especiais foram o grande destaque do MOTELX

Estivemos na apresentação do livro 'O Quarto Perdido do MOTELX - Os Filmes do Terror Português (1911-2006)' e na exibição do filme 'Coisa Ruim'

No passado sábado (10) no Cinema São Jorge, e como parte da 16ª edição do MOTELX, teve lugar a apresentação do livro O Quarto Perdido do MOTELX – Os Filmes do Terror Português (1911-2006). A colectânea, elaborada durante os últimos anos, tem por base a secção Quarto Perdido do festival de cinema e reúne uma nova perspetiva sobre o passado cinematográfico português, cujas histórias e personagens se encontram um pouco esquecidas.

Em entrevista ao Espalha-Factos, João Monteiro e Pedro Souto falaram da importância deste lançamento como parte integrante da edição de este ano do Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa. “Ao longo dos anos fomos descobrindo filmes que nem sequer sabíamos que existiam, filmes bastante curiosos, obviamente não estamos a falar do cinema novo mas são filmes que mostram uma tentativa de um outro cinema em Portugal, que não fez escola mas que existe e merece ser visto”.

Cronologicamente, Os Crimes de Diogo Alves (1911), de João Tavares, é o filme mais antigo mencionado no livro e é também um dos primeiros filmes portugueses e fala sobre o serial killer do Aqueduto das Águas Livres, Diogo Alves. O último é Coisa Ruim, que era até esta investigação era considerado o primeiro filme de terror português.

Do livro fazem ainda parte o primeiro filme (de terror) português realizado por uma mulher, que ocorreu nos anos 40, em pleno Estado Novo, pelas mãos de uma jovem de 22 anos chamada Bárbara Virgínia; um pequeno boom de filmes exploitation por iniciativa do galã António Vilar; e ainda filmes da maior adaptadora do escritor britânico J. G. Ballard, a luso-sueca Solveig Nordlund.

Com a ajuda de vários autores, “todos estes episódios farão parte deste livro, organizado por subgéneros e não cronologicamente, e fornecerão o elo perdido entre o passado e o emergente cinema de terror português”.

MOTELX – Lançamento do Livro ‘O Quarto Perdido MOTELX’ – Divulgação Facebook MOTELX

Na sessão de apresentação, ao lado de João Monteiro, esteve o diretor da Cinemateca, José Manuel Costa. A presença era obrigatória pela “colaboração muito importante da cinemateca através da cedência das cópias, das imagens e também sempre de uma disponibilidade imensa para ajudar, sem nunca questionar o que estaríamos a fazer”, salientou o diretor do MOTELX brincando ainda que “na verdade estávamos a tentar adulterar um bocadinho a história do cinema português mas no bom sentido”.

Para João, nestes 16 anos de festival de género, e ainda antes disso enquanto cineclube, havia sempre aquele medo de estarmos a mexer em filmes que não interessam, filmes esquecidos e esquecidos por uma boa razão e no MOTELX sempre quisemos que todo o tipo de cinema entrasse”, sob o lema do evento de que “é o espectador que decide se o filme é bom ou mau”.

José Manuel Costa começou a sua intervenção com elogios a João Monteiro, o qual diz respeitar imensopelo entusiasmo e seriedade e a curiosidade infinita”, ressalvando “todos os que estão envolvidos neste livro porque há muitos e bons”.

Sobre o livro e sobre o cinema português, o diretor da Cinemateca iniciou “a primeira coisa que me ocorre dizer sobre toda esta aventura, de toda a descoberta de um género desconsiderado sempre na história do cinema português, tem a ver com algumas coisas gerais, que eu acho que são fundamentais lembrar hoje a propósito de toda a questão da leitura ou da releitura da história”.

Sob a questão de definição de género, e porque não havia até à data esse registo dos filmes mais antigos enquanto filmes de terror, José Manuel sublinhou, a primeira questão tem a ver justamente com a questão de género, eu sou de uma geração que tem estado permanentemente, ao longo das décadas, a fazer debates sobre a natureza do cinema português, sobre a sua identidade e uma coisa que ouvi muito e que percebo muito bem é precisamente a ideia de que o cinema português não é um cinema de géneros”

Nessa análise, outra coisa que ouvi sempre muito dizer é que, a haver um género, todo o cinema português pertencia ao mesmo género e o género em Portugal era os  filmes que pensavam Portugal” e “não é só no cinema, é uma questão coletiva, aquilo que para muitos países é uma falta de identidade, Portugal sofre de excesso de identidade”.

A importância deste tipo de registo, que se encontrava apenas presente em algumas pesquisas universitárias e teses de mestrado, é a de que no “espaço de uma ou duas décadas, basta isso, se não se trabalha constantemente ou regularmente a divulgação de um determinado cinema, ele pode desaparecer e com ele a memória de tanta coisa à volta disso”.

Sobre o cinema português, o diretor acredita que “sempre que o cinema português parece estar à beira de uma crise enorme, e às vezes esteve e quase que ia morrendo, nunca morreu, sobreviveu sempre e sobreviveu com a emergência de talentos especiais”. Acredita ainda que este trabalho de procurar novas facetas das obras deve ser “precisamente o trabalho da nova historiografia”.

‘Coisa Ruim’ não é o primeiro filme de género mas é um dos mais valiosos no cinema português

Também na mesma tarde e no mesmo local, Tiago Guedes e Rodrigo Serra estiveram presentes no Cinema São Jorge para apresentar o seu filme, que foi também a primeira longa, Coisa Ruim (2006).

Questionados sobre o porquê de fazer um filme de género, num país que tinha tão pouca (ou até nenhuma) história desse cinema, salientaram não ter dúvida nenhuma desde o início, não tínhamos duvida nenhuma que estávamos a fazer um filme de terror, do género de terror,  e tínhamos muita vontade de o fazer”.

A partir de uma pesquisa sobre lendas portuguesas, o guião foi desenvolvido por Rodrigo Guedes Carvalho e o filme filmado em película de 35mm, com Adriano Luz, Afonso Pimentel, Manuela Couto e Sara Carinhas no elenco.

Coisa Ruim era o nome dado quando nos textos antigos se referiam ao diabo era como coisa ruim”, apesar de ser um excelente título e uma óptima representação do que é este filme, essa designação nunca é mencionada durante o mesmo.

Produzido por Paulo Branco, entrou diretamente na secção Quarto Perdido desta edição, com um foco especial na história do cinema de género em Portugal. O MOTELX regressa em 2023, entre 12 e 18 de setembro.