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Crítica. ‘Euphoria’ desilude mas Zendaya volta a arrasar

A segunda temporada de Euphoria estreou em Portugal esta segunda-feira (10) na HBO Portugal. A obra de Sam Levinson era muito esperada, dada a popularidade da série desde que estreou em 2019.

O nosso grupo de pessoas questionáveis favorito voltou, dois anos depois. As saudades eram muitas, o caos que se aí avizinhava também. Depois de um final de temporada que viu Rue, a nossa protagonista interpretada brilhantemente por Zendaya, a voltar ao mundo das drogas — onde, na verdade, sempre esteve, se virmos bem — como forma de lidar com a separação de Jules, no caso Hunter Schaffer, a curiosidade era muita sobre o seguimento da relação de ambas, até porque os especiais lançados em dezembro de 2020 e janeiro de 2021 davam azo a uma possível reconciliação entre ambas.

Para além disso, tivemos ainda Fez, um jovem traficante interpretado pelo carismático Angus Cloud e uma das pessoas menos questionáveis neste lote de personagens horríveis, a tentar desligar-se de um criminoso extremamente perigoso, numa das cenas mais tensas da televisão dos últimos anos.

Foi precisamente aqui que a segunda temporada começou. Como vem sendo hábito, Euphoria tem sempre a tendência de destacar uma ou outra personagem nos seus episódios, dando-lhes alguma profundidade de forma a perceber o porquê de reagirem ou funcionarem de certa maneira. No caso, e como já vinha sendo pedido há muito tempo, Fez abriu este lote de episódios com a sua história.

Tirando o pequeno pormenor de ser um traficante de droga que vende as suas matérias primas a toda a gente, Fez é, até ver, um amor de pessoa para os seus. Nunca se mete em problemas, para além daqueles relacionados com os estupefacientes, e tenta ajudar sempre aqueles por quem sente algum respeito ou consideração. No entanto, se há coisa que esta temporada veio confirmar é que o lema é “cada um por si”. 

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Afinal de contas, a vida de adolescente é um bocado assim. Euphoria meio que exagera o que se passa numa escola pública – ou então o contexto português é que é muito suave – mas a verdade é que o secundário pode mesmo ser um campo de guerra para quem anda por lá. Todas estas personagens, pelo menos a grande maioria delas, vive numa agonia interior extrema, um desespero tal que acaba por deixar o espectador ansioso no meio de todo este caos. 

A escrita de Euphoria

Isto é já algo visível na primeira temporada mas esta segunda acaba por pegar nessa fórmula e aprofundá-la um pouco. As personagens já nos são familiares, as suas motivações também o são, quanto baste, então fica fácil reconhecer o que cada um vai fazer. Um dos grandes problemas deste lote de episódios é mesmo quando Sam Levinson tenta inventar e jogar com algumas coisas que estão a caminhar para um culminar, quase em piloto-automático, e reverter o que toda a gente pensa que vai acontecer.

Normalmente resulta, mas Sam Levinson não é propriamente conhecido por ser um génio da escrita – Malcolm & Marie sendo o exemplo mais perfeito disto – mas bom realizador até que é. Em certos momentos, claro. Euphoria é uma série que não se coíbe de chocar o espetador com as suas imagens repugnantes e violentas de tudo um pouco mas, às vezes, é apenas exagerado. Por exemplo, nos primeiros 10 minutos do primeiro episódio, temos um bebé a comer uma beata de cigarro. Só dá que pensar nas saudades que os especiais deixaram.

Sim, aqueles especiais lentos, pequeninos, só com aprofundamento de personagem, sem nudez gratuita de cinco em cinco minutos. E depois os episódios vão passando e as ideias vão sendo finalmente mostradas, no meio de mais pénis a voar pelo ecrã, claro. Estes adolescentes que na temporada um pareciam ter a inteligência emocional de uma porta, aqui, até conseguem pensar. Serem razoáveis, até dado ponto pelo menos.

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O facto de parecerem mais humanos podia muito bem funcionar a favor da série nesta segunda temporada, mas não é o caso, muito por culpa da escrita de Sam Levinson, que tenta fazer tanta coisa ao mesmo tempo que a dado momento está toda a gente confusa com as mil e uma coisas a acontecer no ecrã. Dá a ideia que este homem tem o peso do mundo nos seus ombros para continuar o sucesso de uma série que nunca pensou ter um culto tão grande atrás.

As motivações das personagens

Nos sete episódios usados para escrever esta crítica, Euphoria tem muito momentos em que podia ter sido grande e acabou a falhar. Um grande exemplo disso é a festa de ano novo, uma festa regada com álcool e todo o tipo de drogas, onde todas as personagens aparecem, uma a uma, mas com a mesma velocidade com que aparecem acabam por desaparecer, algumas mais rápido ainda. Às vezes, nem sequer dá para matar saudades dessas mesmas pessoas.

No entanto, se há coisa que Euphoria faz bem nesta nova temporada é meter o sentimento de solidão e isolamento que tantos de nós passamos no secundário. Toda a gente vê as coisas da sua maneira, reage e comporta-se apenas a pensar em si mesmo, vivendo o presente como se amanhã já não estivessem cá para o fazer.

Isto era algo que estava presente na primeira temporada mas não tanto como na segunda. No centro desta viragem da visão de cada um está Rue que se torna das piores pessoas desta série mas que nos continua a ser querida de uma maneira inexplicável. Enquanto que muitos deles têm decisões parvas e perigosas apenas e só porque só jovens estúpidos que não pensam muito bem nas coisas, Rue também o é, mas de uma maneira diferente.

Ao contrário de todos os outros, a própria Rue sabe que está a autossabotar-se ou a destruir as suas relações pessoais, muito por culpa do seu vício que a vai guiando de cena em cena, de perigo em perigo, de situação de quase morte em situação de quase morte. O talento de Zendaya a interpretar esta personagem é mesmo algo inexplicável para o comum mortal. 

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A forma como ela consegue fazer o que faz com o material que tem à sua disposição é incrível. Por coisas como esta é que acabou por ser laureada com um Emmy no ano passado e foi considerada a figura internacional do ano para o Espalha-Factos. No entanto, lá estão Sam Levinson e a sua escrita de novo.

A rota da sua personagem, apesar de ser muito mais arriscada do que aquela que vimos na temporada passada, é a mesma. Como tudo na vida, quando é demais acaba por se tornar cansativo, a dado ponto. O episódio que começa com ela a destruir a sua própria casa parece algo que já vimos um milhão de vezes, apenas com uns decibéis acima daqueles que existiram nas outras situações.

Se há coisa que temos que elogiar nesta temporada é a personagem de Sidney Sweeney, que foi das poucas que verdadeiramente recebeu uma mudança de atitude, para além do tal isolamento falado em cima. A cada episódio, o colapso nervoso é diferente, por mil e uma razões. Sidney Sweeney, como há muito tempo vem sendo dito, tem talento para dar e vender e pode muito bem ser a maior vencedora da história que se repete de forma mais arriscada nesta segunda temporada.

Em jeito de conclusão, Euphoria sucede nesta segunda temporada, mas não tanto quanto esperávamos. Sam Levinson criou uma história que tenta ser emocional a um ponto de exaustão e que, no fim do dia, parece inautêntica. Existem aqui tantas cenas que podiam não existir e tantas coisas que podiam ser mudadas que é só frustrante ver uma série que nos é tão querida a ser mais do mesmo. No entanto, veremos na mesma, com certeza, com o amor de sempre. Mas podia ser tão melhor. Por agora, há episódio novo todas as segundas na HBO Portugal. 

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