Foi a 26 de setembro de 1960 que o mundo viu o primeiro confronto político em televisão. Tratava-se do primeiro de quatro debates, entre Richard Nixon e John F. Kennedy, para as Eleições Presidenciais americanas.
60 anos depois, os debates televisivos não são mais uma novidade e são considerados um momento importante de qualquer ato eleitoral, indispensável até.
Os debates televisivos nos Estados Unidos da América, onde começa a tradição
1960: Kennedy-Nixon
Diz-se ter sido nos Estados Unidos da América que se inventou a televisão, no final da década de 1940. Nos anos 50, uma televisão era já um importante requisito de uma sociedade consumista, que recuperava da Guerra e se juntava já a outra (mais Fria mas distante, invisível), servindo para mais do que um meio de informação aliado à rádio ou aos jornais.
Foi neste país que, em 1960, se debateu, pela primeira vez, política no pequeno ecrã. Os candidatos às Eleições Presidenciais de 1960, moderados por Howard K. Smith, nos estúdios da WBBM-TV (atualmente Channel 2). Tratavam-se de um Senador, John F. Kennedy, e do Vice-Presidente à altura, Richard Nixon. Passando nos ecrãs de 70 milhões de norte-americanos, este era o primeiro de quatro debates, que se dariam durante o mês de outubro, e davam, pela primeira vez, a oportunidade de comparar, igualmente, os dois candidatos a Presidente da mais importante nação do mundo.
O impacto deste debate nos eleitores foi surpreendente. Para além de ser o primeiro, deu uma enorme vantagem a John F. Kennedy que, menos experiente do que Nixon, e não particularmente favorecido pelos outros três debates, acabou por vencer ao Vice-Presidente de Dwight Eisenhower (Presidente dos EUA de 1953 a 1961) nas eleições de 8 de novembro, tomando posse a 21 de janeiro de 1961.
O governo de Kennedy foi especialmente polémico e começou logo pelas eleições, em que surgiram rumores de fraude eleitoral que, ainda hoje, é impossível de confirmar (devido a uma desorganização no sistema de voto). Dois anos depois de ter tomado posse, o 35.º Presidente dos Estados Unidos da América foi retirado do poder da pior forma possível: JFK foi assassinado durante uma visita política a Dallas, no Texas.
2000: Bush-Al Gore
A partir de setembro de 1960, o debate televisivo tornou-se num fenómeno, desde então tendo sido repetido em todas as eleições presidenciais dos Estados Unidos. Embora possamos mostrar vários debates impactantes, ora pela polémica, ora pelo destaque nítido de um ou outro candidato, releva-nos viajar até 2000 e olhar as Eleições Presidenciais onde a disputa foi entre Al Gore (Vice-Presidente de Bill Clinton e representante do Partido Democrata) e George W. Bush (Governador do Texas e representante do Partido Republicano).
As Eleições Presidenciais de 2000 ficaram marcadas pelo longo processo de contagem de votos, que atrasou os resultados cerca de um mês face ao previsto.
A situação foi renhida: Bush teve 271 votos do Colégio Eleitoral enquanto Al Gore teve 266. Este foi um dos momentos eleitorais em que o voto do Colégio Eleitoral não coincidiu com o voto popular, fenómeno que vimos repetido em 2016, também com um Clinton aqui para o meio, embora com uma margem bastante superior de votos atribuídos ao candidato republicano pelo Colégio Eleitoral em função do candidato democrata.
2016: Trump-Clinton
O candidato democrata destas eleições era Hillary Clinton, que ganhou a representação do Partido Democrata contra o também emblemático Bernie Sanders. Já o candidato republicano, bem o conhecemos, como atual Presidente dos Estados Unidos da América e candidato às próximas eleições, em 2020, contra Joe Biden (Partido Democrata), ele sendo Donald Trump.
As Eleições disputadas em 2016 foram um dos momentos mais importantes da política internacional no século XXI, e as próximas eleições presidenciais americanas vão pelo mesmo caminho. Donald Trump parecia ter tudo para perder contra Hillary Clinton, candidata não particularmente adorada mas suficientemente agradável para suceder a Barack Obama e impedir o empresário de chegar ao poder.
Os debates – e outros momentos – televisivos em que os candidatos presidenciais apareciam viraram facilmente vídeos curtos de frases marcantes ou situações questionáveis, rapidamente enchendo a Internet de motivos para pedir por outras pessoas na frente de um dos mais influentes países do mundo.
Os momentos anteriores à eleição, a 8 de novembro de 2016, foram marcados de escândalos que se iam revelando sobre os dois candidatos, desde e-mails suspeitos ao envolvimento da Rússia neste ato eleitoral. Enfim, comprovou-se até a influência do Facebook, através de anúncios, nos resultados eleitorais (bem como no Brexit, descobriu-se).
Tal como na eleição de 2000, também o candidato democrata destas eleições venceu-as pelo voto popular, mas ficou aquém no voto do Colégio Eleitoral, maioritariamente Republicano, que deu a Trump 304 votos e a Clinton apenas 227.
Os debates televisivos em terras lusitanas
O cenário político em Portugal é bastante distinto do cenário político nos Estados Unidos da América. As Eleições Presidenciais não têm particular destaque em função das Eleições Legislativas, derivado da distribuição dos poderes políticos pelos órgãos de soberania (enquanto que os EUA têm um regime presidencialista, Portugal tem um regime semipresidencialista, que pouco destaque dá ao Presidente da República em função da Assembleia da República).
Fechados numa ditadura até 1974, os portugueses não viam a televisão como um meio de informação (pelo menos, da não-permitida pelo Estado) e seriam até poucos os agregados familiares que tinham o pequeno (na altura, possivelmente grande, se formos fiéis à realidade) aparelho em casa.
Uma Revolução pacífica (25 de abril de 1974) depois, viveu-se um ano de terror iminente no país pacato ao fundo da Europa, com uma esquerda dividida e uma direita escondida.
1975: “Olhe que não, doutor, olhe que não…“
Foi a 6 de novembro de 1975 que Mário Soares (PS) e Álvaro Cunhal (PCP) se reuniram para discutir política socialista, num debate transmitido por todo o país. Os dois políticos, bem como todos os portugueses, acabavam de viver um verão quente, época que ficou conhecida por uma enorme instabilidade na governação do país.
A primavera de 1975 tinha sido, também, um tiro no pé à esquerda revolucionária: apesar das esperanças de levar a cabo uma verdadeira revolução socialista em Portugal, tal e qual se viveu no Leste, o PCP não tinha conseguido uma maioria nas Eleições para a Assembleia Constituinte, responsável por elaborar a Constituição da República Portuguesa tal como ficou conhecida, em 1976, pelos portugueses, e onde o PS levou avante.
Apesar de se tratarem ambos de candidatos de partidos de esquerda, a sua ideia do projeto socialista divergia imensamente, levando à necessidade de sentar Soares e Cunhal à mesa para chegar a algum tipo de consenso (spoiler alert: não aconteceu, o 25 de novembro de 1975 ditá-lo-ia, e seguir-se-ia o 25 de abril de 1976, data das primeiras Eleições Legislativas livres).
Este debate ficou na História da 3.ª e atual República de Portugal, ainda hoje se repetindo as emblemáticas palavras de Cunhal quando acusado de querer instalar uma ditadura em Portugal: “olhe que não, doutor, olhe que não“. Também este é o debate mais longo da História de Portugal, transmitido durante mais de 3 horas.
2019: A quebra da Geringonça confirmada em debate
Comparamos o primeiro debate político televisivo relevante desta 3.ª República com o mais recente, num número bastante superior em momentos de discussão, em pessoas a discutir, e com bastantes mais meios e mais ideias para partilhar.
As Eleições Legislativas de 2019, em Portugal, tiveram um programa de debates completo, e dividido pelos três grandes canais (RTP, SIC e TVI). Primeiro contemplando debates a dois, entre líderes parlamentares eleitos em 2015, e depois contemplando um debate entre todos os 6 (Jerónimo de Sousa, PCP; Catarina Martins, BE; André Silva, PAN; António Costa, PS; Rui Rio, PSD; Assunção Cristas, CDS).
O debate entre os seis candidatos, um dos mais importantes da altura eleitoral em causa, foi transmitido na RTP e moderado pela, à data, Diretora de Informação do canal público, Maria Flor Pedroso.
Aquele que ficou marcado como o último debate antes das eleições teve as suas polémicas. Ainda antes de acontecer, discutiu-se a moderação, pelos laços familiares entre a moderadora e o então (bem como atual) Primeiro-Ministro, António Costa. Mas isso estaria longe de ser um problema para os políticos de esquerda, que já tinham a mira uns nos outros, apesar de terem aguentado os quatro anos anteriores a dar a mão pelo país. Pôde, afinal, a esquerda unir-se?
Um outro momento particularmente importante para as Eleições Legislativas em 2019, e que poderá ter sido determinante nos resultados das mesmas, foi o debate dos pequenos partidos, também transmitido na RTP e moderado por Maria Flor Pedroso. Os 15 candidatos sem representação parlamentar tiveram, pela primeira vez, tempo de antena para todo o país simultaneamente.
Juntaram-se Amândio Madaleno (PTP), André Ventura (Ch), Carlos Guimarães Pinto (IL), Fernando Loureiro (PURP), Filipe Sousa (JPP), Gil Garcia (MAS), Gonçalo da Câmara Pereira (PPM), Joacine Katar Moreira (Livre), José Pinto Coelho (PNR), Manuel Ramos (MPT), Maria Cidália Guerreiro (PCTP/MRPP), Marinho e Pinto (PDR), Mendo Henriques (Nós, Cidadãos), Santana Lopes (Aliança) e Vitorino Silva (RIR), representativos de todo o espectro político.
Em 2015, entrara um partido pequeno no Parlamento: o PAN. Em 2019, mais três se juntavam a este (que, entretanto, conseguiu nesta legislatura mais de 1 deputado): o Chega, que lá colocou André Ventura; o Livre, que foi representado por Joacine Katar Moreira; e o Iniciativa Liberal, representado por João Cotrim Figueiredo. Todos eleitos pelo círculo de Lisboa.
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A televisão influencia a forma como votamos?
A resposta é… talvez.
O pequeno ecrã ajuda a uma maior partilha de ideias por todos os votantes, é um meio por onde flui uma quantidade gigante de informação ao minuto, e a própria forma como vemos e ouvimos os candidatos poderá, também, influenciar as nossas escolhas.
Pedaços de História contam-nos que “é curioso pensar quem teria sido eleito se a tecnologia moderna não estivesse presente na História dos Estados Unidos“, acrescentando alguns factos: George Washington usava dentadura, Abraham Lincoln tinha uma voz muito aguda e William Howard Taft pesava mais de 130 quilos.