A SIC Notícias decidiu, esta segunda-feira (27), parar de emitir programas de debate desportivo que tenham no seu painel comentadores que representam clubes. Ricardo Costa, diretor de informação da Impresa e da SIC, considera que as estruturas de comunicação dos clubes “estão a matar a pouco e pouco a indústria do futebol“.
Numa entrevista ao jornal Público desta quarta-feira (29), Ricardo Costa consta o agudizar do ambiente “tóxico” vivenciado nestes programas de debate desportivo: “O que está em causa não é a qualidade intrínseca dos programas ou dos comentadores, que analisados em separado todos têm muito valor; o problema é todo o ambiente criado: tóxico, totalmente intolerante e particularmente fanático“.
E aponta os principais culpados: “Um canal de televisão não é alheio a isso porque tem o programa no ar e o papel dos clubes de futebol e das suas máquinas de comunicação é também absolutamente inequívoco“.
Para o diretor de informação, as estruturas de comunicação dos clubes estão a atuar como máquinas de propaganda: “Nos últimos anos, a comunicação e assessoria de imprensa dos clubes deixou de assessorar o que quer que seja porque os jogadores, treinadores e dirigentes não dão entrevistas, não há reportagens, nada há nada para assessorar“.
Os assessores passaram a ser directores de propaganda, criaram estruturas que não aceitam qualquer ideia de independência fora dos seus universos e trabalham isso nos canais de TV dos clubes, e depois funcionam por réplica no Facebook, Twitter, Instagram, WhatsApp de forma sistemática e permanente”
Ricardo Costa acusa os clubes de bloquearem “o acesso à matéria-prima normal“, impedindo os jornalistas de “de fazer aquilo que é o essencial que é reportagem e entrevista“. O responsável estende as críticas ao Canal 11, da Federação Portuguesa de Futebol: “há quanto tempo ninguém consegue fazer um trabalho de jeito com um jogador da selecção? Esses trabalhos serão do Canal 11. E quando houver um problema com a selecção, como aconteceu no Mundial da África do Sul com Carlos Queiroz ou a patética digressão pelos EUA antes do Mundial do Brasil, não vamos ter acesso“.
“Há um jardim murado com jogadores do Porto, Benfica, Sporting ou da selecção e todos os trabalhos são feitos ali porque é um ecossistema que protege o clube e os patrocinadores e impede qualquer trabalho que não seja controlado por eles. É um erro crasso para a indústria de futebol”
O responsável pela informação do grupo Impresa vai mais longe e sugere mesmo que “os clubes deviam despedir todas as estruturas de comunicação e fazer tudo de novo“. “E não tem a ver com as pessoas que lá estão — o Luís Bernardo, o Miguel Braga, o Francisco J. Marques ou com outros. Têm que fazer um reset muito grande porque acham que estão a defender os clubes mas não estão. Estão a matar os clubes e o futebol”.
SIC Notícias reformula para “dar um salto em frente na grelha”

Acerca da nova programação de desporto, o responsável afirmou que o que “interessava era dar um salto em frente na grelha“, não havendo, para já, “nada de concreto“. “O desporto era, é e será importante para a SIC Notícias; dizer o contrário era um absurdo, mas não temos monocultura. Temos os direitos da Liga Europa, continuamos a fazer análise pós-jogo; temos o Jogo Aberto e o Tempo Extra do Rui Santos que vão continuar”.
A intenção seria trazer “o que mais falta faz em Portugal“: “reportagem e entrevista com os protagonistas do desporto, que valem mais do que a análise estatística ao 4x4x2, jornalisticamente e para o futebol“. Embora o próprio reconheça já dificuldades passadas: “No ano passado tivemos uma rubrica no Jornal da Noite que era o Vamos a Jogo, com jogadores de futebol, e foi mais fácil fazer com jogadores que estavam no estrangeiro do que com os que estavam cá“.
“Terão que ser os clubes a mudar o chip, deviam acordar. Eles estão a fazer mal aos próprios clubes e ao desporto, estão a matar a pouco e pouco a indústria do futebol”, remata Ricardo Costa.