O Diabo de Hell’s Kitchen regressa hoje (19) à Netflix, depois de uma aventura mais sobrenatural em The Defenders. Mas Daredevil promete regressar às origens na terceira temporada, com o fato artesanal e o regresso de Wilson Fisk, acompanhado pelo mortífero Bullseye, num plano para destruir as duas vidas de Matt Murdock.
Esta terceira temporada é sem dúvida o lançamento mais esperado pelos fãs da Marvel na Netflix. E depois de ver os primeiros seis episódios, arriscamos-nos a dizer que — perdoem o trocadilho — acertou no alvo.
[alert type=white ] Spoilers de Daredevil e The Defenders [/alert]
Renascido, de facto
Matt Murdock (Charlie Cox) sacrificou-se pela sua cidade em Midland Circle, no final de The Defenders. Poucos sabem o que realmente aconteceu, entre eles Karen Page (Deborah Ann Woll) e Foggy Nelson (Elden Henson), amigos e ex-colegas de Matt, que o julgam morto.
Mas Matt sobreviveu e conseguiu arrastar-se, ainda às portas da morte, até ao orfanato e igreja onde cresceu à procura de uma freira, Maggie (Joanne Whalley).
A explosão fez mais do que partir costelas, deixou Matt surdo de um ouvido, com os sentidos debilitados. Pela primeira vez desde criança, Matt está verdadeiramente vulnerável. Não pode confiar nos seus hiper-sentidos para fazer parkour sem ver, detetar mentiras na pulsação dos outros ou lutar antecipando os golpes do adversário.

Mas não é só o corpo que está destruído. Matt está desiludido na sua fé, tanto em Deus como na justiça que praticava de dia enquanto advogado.
A sua recuperação é o foco principal dos primeiros episódios e faz um bom trabalho em mostrar o quão perdido Matt está nesta nova realidade. Sente-se profundamente desiludido com o mundo e disposto a abraçar completamente o seu alter-ego vigilante.
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No entanto, encontra algum triunfo à medida que recupera e testa as suas habilidades, por vezes com consequências drásticas. Maggie e o padre Lantom, que acompanham Matt desde criança, procuram trazê-lo de volta à luz, mesmo tendo alguma dificuldade.

Enquanto Karen trabalha como repórter no New York Bulletin, e ainda espera o regresso de Matt, Foggy força-se a aceitar que o seu melhor amigo desapareceu de vez, apesar de não conseguir lidar com isso.
É então que Matt descobre que Wilson Fisk (Vincent D’Onofrio), o homem que pôs na prisão, está de saída sob um acordo de informante com o F.B.I. que deixa Nova Iorque revoltada com o sistema. Matt está disposto a ir ao limite para derrubar Fisk, pondo em risco os seus amigos e o que resta da sua vida para o impedir.
Rei da selva urbana
O rei do crime está preso desde a primeira temporada e procura garantir o regresso da sua amante Vanessa, uma fugitiva por associação a ele. Wilson Fisk regressa em grande e mostra, mais uma vez, porque é um dos melhores vilões na Marvel.

Simultaneamente intenso e frágil na sua presença, a atuação de Vincent D’Onofrio varia entre um mestre manipulador e um homem à procura de companhia com quem se pode simpatizar.
Se há uma crítica que se pode fazer à narrativa de Fisk é que a sua motivação parece distante. A situação de Vanessa resume-se a pouco mais do que um plot device inicialmente, mas esta situação rapidamente se redime quando Fisk procura vingança por Matt ter ameaçado a segurança de Vanessa. Mas para tal, Fisk precisa de entrar nas boas graças da lei.
Vigilante Fora-da-lei

O agente por detrás do controverso acordo, Ray Nadeem (Jay Ali) é um personagem que, apesar de complicar os planos de Matt em múltiplas ocasiões, nunca é visto como um fardo. Embora parte do seu conflito inicial seja um bocado forçado, recorrendo a clichés desnecessários para criar simpatia imediata, a sua motivação torna-se genuína.
Contudo, o prémio para agente do F.B.I. mais letal e volátil vai para Benjamin “Dex” Pointdexter (Wilson Bethel), também conhecido como Bullseye. Dex é introduzido de forma mais gradual, mas rapidamente se torna numa presença forte, mesmo no contexto da longa rivalidade de Matt e Wilson Fisk.

Dex é visto por Fisk como um asset perfeito para destruir Daredevil, incriminando-o e dando ao povo um inimigo comum.
Não só é um oponente formidável para Matt, sendo o seu primeiro combate um dos melhores de toda a série, como é uma personagem trágica que simultaneamente espelha Matt e Fisk, mostrando-os mais semelhantes do que gostariam de admitir.

É aqui que Matt Murdock e Daredevil chocam em colisão frontal. A sua identidade está cada vez mais frágil e Matt deixa-se levar pela sua luta, torna-se imprudente nas suas decisões, e ambos os seus lados se tornam alvos não só de Fisk, mas das autoridades.
As ameaças para Foggy e Karen também estão cada vez mais reais, o que ajuda a ilustrar a importância da identidade secreta e daquilo que está em jogo se esta for descoberta.

E a cena do corredor?
Tudo o que vamos dizer sobre o assunto é: Sim, há uma luta num corredor. E é ainda mais intensa, ao ponto da nossa própria respiração ser uma tarefa difícil.
Esta e outras cenas de ação são do melhor que se faz em acção. São viscerais, rítmicas, recheadas de impacto, mas sempre motivadas por uma clara linha de progresso. Tal como as temporadas anteriores lembram filmes como The Raid ou Oldboy, o ataque-contra-ataque de todas as acções é ilustrado visualmente através de excelente cinematografia e coreografia.

Aliás, toda a direção de fotografia e edição merecem menção pelo seu uso de cor e contraste temático entre personagens, assim como o excelente uso de mistura de som para transmitir os incríveis poderes de Matt para meros mortais e para mostrar o quão limitado ele se sente pela sua falta.
Há também momentos em que somos colocados na perspectiva de outros personagens. Uma destas ocasiões sobressai ao pegar numa simples leitura de documentos e transforma-la em algo extremamente íntimo e trágico.
Por outro lado, há uma cena em particular que recorre a um cliché que fica out of place no contexto da série.
Não é que seja mal executada, mas é uma decisão que parece ser um atalho criativo, que acaba por invocar outra série com alguns paralelos a Daredevil.
Vale a pena voltar a Hell’s Kitchen
Esta temporada leva Matt e Daredevil ao limite da capacidade humana. As ameaças são mais palpáveis do que nunca, com Poindexter a revelar-se uma excelente adição a uma série que já não tinha falta de bons antagonistas.
A acção está com a qualidade esperada e a utilização criativa de cinematografia e edição tornam até momentos mundanos em pontos de viragem para cada personagem.