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Xutos & Pontapés
Fotografia: Sónia Pena / Espalha-Factos

Os Xutos não são só ‘A Minha Casinha’

Os Xutos & Pontapés não são (só) A Minha Casinha, Circo de Feras e Contentores. Quase 40 anos de carreira e 13 álbuns trouxeram-nos canções espetaculares e bem diferentes dos incontornáveis refrãos que estamos fartos de conhecer. Convidamos-te a vasculhar a obra dos Xutos, por ordem cronológica, em mais uma homenagem ao guitarrista Zé Pedro.

Quando eu morrer

Não levarei flores pro meu buraco. Começamos pelo primeiro álbum, 78/82. São uns Xutos longínquos do registo que conhecemos: libidinosos, profanos, muitas vezes boçais. Está remasterizado no Spotify mas dele parecem só ter sobrevivido, nos alinhamentos ao vivo, Sémen e Mãe. São as letras mais cruas de toda a carreira. Não é o que mais me agrada mas resume na totalidade o mote sexo, drogas e rock n’ roll. Quando eu morrer enfrenta sem rodeios a droga e a morte.  

https://www.youtube.com/watch?v=IGa5A8zJyHs

Conta-me Histórias

Amas a vida e eu amo-te a ti. Uma declaração de amor em modo lento cantada por um jovem Tim. Pertence ao álbum Cerco, de 1985, o primeiro com a mais duradoura formação, já com Gui (saxofone) e João Cabeleira (parêntesis escusados). Teve direito, em 2005, a uma versão lindíssima na voz da Manuela Azevedo dos Clã.

Esta Cidade

O poder podre dos homens normais está a tentar dar cabo de mim. Conheci-a através do Jorge Palma e andei durante algum tempo enganado sobre a sua autoria. Começa com um inesquecível solo de saxofone e é uma das melhores cartas de apresentação de uns Xutos reivindicativos e desalinhados. Faz parte do terceiro álbum, Circo de Feras, o primeiro grande desfile de clássicos (Não Sou o Único, Contentores, Vida Malvada e Circo de Feras) e provavelmente o mais importante da banda.

As Torres da Cinciberlândia

Ele há um sítio entre a estrada e o mar que fica de fora para quem lá quer chegar. Nunca percebi o que esta música quer dizer nem me importei nadinha com esse pormenor. Tem uma energia especial, que não sei justificar, e gravita na lista das minhas preferidas. Acho que as sete torres da Cinciberlândia são aquilo que tu quiseres. Pertence a 88, um álbum com uma produção claramente mais elaborada e pai das eternas À Minha Maneira, A Minha Casinha, Para Ti Maria e ENQUANTO A NOITE CAI (não consigo dizer estas quatro palavras sem gritar).

https://www.youtube.com/watch?v=JXdZIKU4aQk

OP53 (O Vento)

Febril, elétrica, paranóica. Uma malha do provavelmente mais injustiçado disco, Gritos Mudos, que viu tantas músicas deixadas para trás. Prepara o casaco de cabedal e os ombros para o mosh de I Love to Play, Melga ou Futuro Que Era Brilhante. Que bem sabe voltar à fase mais rabugenta destes senhores. Estão também aqui escondidos alguns dos melhores momentos do João Cabeleira e do Gui, que o cifras.br nunca conseguirá ensinar. Estaciona aqui.

Estupidez

Anda tudo a ver se mama nesta união da tanga. Gritavam em coro a desilusão da entrada na União Europeia. Veio em 1992 com Dizer não de vez, precisamente no ano em que os GNR lançavam o álbum mais emblemático da carreira, Rock in Rio Douro. Tem um punhado de canções políticas de que fazem parte Dia de S. Receber e Chuva Dissolvente – percebe-se, volta e meia, que a efervescência está a ser tomada pelas responsabilidades adultas.

Tonto

Era a sério, eras tu. No álbum ainda é cantada pelo Tim, mas foi sempre assumida em concertos pelo Kalu e Zé Pedro. Quem diria que seriam os dois durões da banda a verter a balada mais lamechas? Direito ao Deserto, de 1993, abre portas aos primeiros momentos de contemplação (paragem obrigatória na acústica Pequenina) mas são ainda a excepção. Nasce neste disco o Jogo do Empurra e nasci eu neste ano. Eles estavam mais perto dos 40.

Negras como a Noite

Vaaaaaai ficar tudo bem. Este exercício está cada vez mais complicado. Mas não hesito em destacar este que parece um hino, cheira a hino, sabe a hino e é um hino. Não sei como a coisa anda entretanto, mas foi durante algum tempo o último dos encores dos Xutos (se gostas desta toada épica: é parecida, mas melhor que Para Sempre). É dos Dados Viciados (1997), que tem Dá um Mergulho (banda sonora oficial dos meus ollies mal feitos no 7.º ano) e a bonita e culta Manhã Submersa.

Tão Longe de Ti

E as horas custam tanto a passar / Fazem-me ansiar pelo fim do dia / Para voltar ao brilho da tua alegria / E à calma quente que me sabes dar. É um álbum desavergonhadamente romântico e alguém mais informado poderá esclarecer-me se foi feito ou não de propósito para o filme Tentação (homónimo). As letras são mais curtas, nalguns casos inexistentes, e as guitarras estranhamente dóceis. Nesta ternurenta Tão Longe de Ti o Zé Pedro faz a segunda voz do Tim e o João Cabeleira imita-os com o solo de guitarra.

Fim do Mês

Sabia bem um cervejola / Para ver a bola / Pequeno prémio / Sempre ajuda a aguentar. Foi, certeza absoluta, a minha primeira música preferida deles e a primeira memória que tenho dos Xutos. Cheia de ginga, com aquela segunda voz E nós sempre a esticar que me encarregava de imitar com a competência de quem pode ser convocado para palco a qualquer momento. Chegou o séc. XXI e os Xutos não estavam ultrapassados, bem pelo contrário. Este álbum de 2001, quando tudo começou para mim, traz ainda a monstruosa Se Não Tens Abrigo. Que prazer regressar aqui. Obrigado.

Fim-de-Semana

Um dia eu serei chama se fores a minha companheira. Escolhi a Fim de Semana como podia ter destacado outra qualquer de Mundo ao Contrário, o único álbum do qual conheço e gosto de todas as músicas. Estes são os Xutos que, definitivamente, se podem mostrar aos filhos, mas que, em 2004, também não deixavam por mãos alheias a intervenção: Diz-me (sobre o aborto) e Zona Limite (guerra do Iraque) são os melhores exemplos. Sombra Colorida é fantástica, mas tem o Tim a esforçar-se demais para chegar uns tons acima e começa aqui o meu desencanto.

Depois disso os Xutos & Pontapés lançaram ainda mais dois álbuns de estúdio (já agora, alguns dos álbuns ao vivo valem muito, muito a pena) mas já não me conseguiram convencer. Achei as composições mais preguiçosas e a banda cansada disto que é o rock n’ roll. Algures no Puro ouve-se a palavra marado e aquilo soa-me tudo muito mais a Sony que a Xutos. Mas pode ser de mim.

Tenho um carinho muito grande pela banda, pelo que representam e pelas portas que abriram, porque me permitiram descobrir, a partir deles, muita música nova (que eles também inspiraram). Sempre a partir deles. Porque o primeiro amor não se esquece.

 

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