Hoje estreia nas salas de cinema portuguesas a última obra de Tim Burton, Olhos Grandes. Um filme um pouco diferente dos enredos que o realizador nos habituou a ver. Não há noivas cadáver, vampiros, homens com mãos de tesoura, nem outras personagens insólitas do terror imaginário. Olhos Grandes baseia-se numa história verídica, que explora um assunto muito realista: o mundo da arte e a arte de roubar.
Este é um dos filmes mais intimistas de Tim Burton. Olhos Grandes retrata o sucesso do pintor Walter Keane, que revolucionou a comercialização da arte nos anos 50/60 com as suas pinturas de crianças com olhos grandes. Walter Keane não é na realidade o pintor das obras, mas um charlatão que se aproveita do talento da mulher, Margaret, e da sua lábia de comerciante para vender quadros e enganar os clientes.
A história é um pouco previsível, pois desde o início sabemos que Margaret Keane irá revelar-se como a verdadeira autora dos quadros, desmascarando o seu marido impostor. Contudo o filme ganha mérito pelas fantásticas performances de Christoph Waltz e Amy Adams, atores nunca antes vistos em filmes de Tim Burton, mas que, sem dúvida, passarão a fazer parte do seu elenco.
Para além do roubo da identidade de uma artista, Olhos Grandes critica a desigualdade de género vivida nos anos 50. Nesse tempo, as mulheres não tinham direito ao trabalho sem autorização dos maridos, nem voz no mundo das artes. Este panorama social tornava propício a que os homens tivessem maior possibilidade de singrar em qualquer carreira do que as mulheres.
Neste caso, esta mentalidade facilitou que Walter Keane desse a cara pelos quadros da sua mulher, sendo esta submissa ao seu pedido, enquanto ele se pavoneava no seu império de glória. A emancipação feminina nos anos 70 e o compromisso religioso contra a mentira ajudaram Margaret a ganhar coragem e a reivindicar os seus direitos sobre as obras.
Por outro lado, o filme também critica a hipocrisia nas artes. As pessoas que alcançam a fama são aquelas que conhecem mais personalidades no meio e não aquelas que possuem talento e merecem ser reconhecidas. Observa-se esse facto pelo modo como as obras de Margaret Keane foram lançadas no mercado, através de um escândalo entre Walter e uma celebridade.
Muitos dizem que Tim Burton perdeu o seu toque pessoal neste novo filme, sem a dupla Helena Bonham Carter e Johnny Depp, e as narrativas fantásticas. Bonham Carter separou-se do realizador e, por conseguinte, dificilmente a veremos novamente num dos seus filmes e Johnny Depp dedica-se agora a produções de cariz mais comercial, como é o caso de O Excêntrico Mortdecai.
Apesar do registo ter mudado, o realizador continua a refletir o seu estilo único em vários pormenores do filme. Os olhos proeminentes das pinturas, que dão título à obra cinematográfica, fazem lembrar os contos de halloween infantis em que Tim Burton tanto se inspira. O louco Walter Keane com o seu histerismo não fica atrás de muitas personagens excêntricas da autoria do realizador que já passaram pelas telas.
Um filme belíssimo com uma história tocante sobre a força feminina, mas que não fascinou a crítica nem a Academia.
7/10
Ficha Técnica: