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‘O Rapaz das Fotografias Eternas’: “uma narrativa mágica sobre os habitantes da Vila de Claraboia”

O Rapaz das Fotografias Eternas é o primeiro romance de Edson Athayde, um dos criativos mais premiados de Portugal. Uma divertida e dramática fábula para gente crescida sobre a aventura de Pedro, o Rapaz das Fotografias Eternas, que,  na solar Vila de Claraboia, se cruza com “personagens maiores do que a vida: as três Marias, cada uma com a sua mania; Bakunin, o cão que fala em russo; Alaor, o viúvo da mulher que nunca nasceu; Apolónio, o barbudo que fabrica guarda-chuvas; Flora, a falsa oráculo nipo-andalusa; Jonas, o que será louco, poeta ou morto”.

Num tom coloquial e com laivos de português brasileiro, Edson Athayde constrói uma narrativa mágica sobre os habitantes da Vila de Claraboia, um lugar surreal, genialmente arquitetado e, sobretudo, frequentado por personagens hiperbolicamente atraentes. Cada capítulo, de duração reduzida, começa numa página preta, com a primeira frase da página seguinte impressa a branco, e a citação inicial, da autoria de Jorge Drexler, é simplesmente mágica, sintetizando a essência d’O Rapaz das Fotografias Eternas.

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“Um conjunto de moléculas postas de acordo de forma provisional. Um animal prodigioso com a delirante obsessão de querer perdurar. Não deixaremos rastro, apenas pó de estrelas.”

A “ousadia de Pedro de se meter com o infinito” leva-nos a conhecer as histórias estranhas dos habitantes insólitos de uma vila (em que não chove) fundada por Apolónio, um fabricante de guarda-chuvas, porque “a evidência do bom tempo do lugar, em vez de o desanimar, provocou o inverso. Ele não nascera para fazer o que os outros queriam, nem para vender o que precisavam. (…) Foi um sucesso.”

Ainda que Pedro seja a nossa, alegada, personagem principal, não é de todo a mais cativante. Sobretudo porque temos as Marias, dramaticamente divertidas – com especial destaque para a que é simplesmente: ingénua, sonhadora, deixando escapar o que importa, porque vive para dentro, nasceu não depois de 9 meses, mas depois de 13, o número do azar. Já para não falar do segredo de Maria, a Imaculada, que após nos provocar pena, nos faz sorrir levemente. Ou a história de Alaor, que é absurda e profundamente triste – como é que se perde uma mulher que nunca nasceu? Ou a de Jonas, que precisa de aprender uma lição deveras valiosa, capaz de lhe salvar a vida.

“Quando soube das profecias de Flora, Jonas percebeu que algo importante estava para acontecer. Sentiu-se aliviado. Ele, que nunca havia escrito uma linha de verso, acreditava que não enlouqueceria, sendo que morrer e ressuscitar não faziam parte dos seus planos. Estava decidido a ser um bom amante.”

Histórias cómico-trágicas recheadas de bom humor, ironia e deliciosas metáforas, que nos impelem a criar uma importante corrente discursiva acerca do que é a realidade e do que é sonho, do que é eterno e do que é efémero. Porque nunca estamos certos de estar acordados ou porque a vida é como nós a pintamos? Porque perdura o que nos marca a alma ou porque não há nada que fique para sempre?

“Presenteou-a então com o melhor sorriso do mundo, um sorriso de alma aberta e um milhão de dentes, um sorriso ancestral, visceral, descomunal, um sorriso tão poderoso, com tanta energia que a pobre velha foi incapaz de resistir, desintegrando-se. Não sem antes sorrir de volta e sussurrar no seu ouvido um terno e sincero «obrigada».”

Nota final: 8 /10