Os longos vestidos de Alves/Gonçalves esvoaçaram pela paserelle do Portugal Fashion Sprinkle, no Museu Nacional de História Natural e de Ciência. A quarta feira passada marcou o único dia do evento em Lisboa, contando também com a presença dos HIBU, João Melo Costa, Storytaylors e TM Collection.
A dupla formada por Manuel Alves e João Manuel Gonçalves apresentou uma coleção que pretendia ser usável no dia a dia, apostando em looks como as transparências totais, estampados de polka dots e um contraste entre o maxi e o mini.
Uma colecção para a mulher dos dias de hoje, que é descontraída, mas sem perder a sensualidade, “uma mulher diáfana que não tem medo que a luz penetre no seu corpo e de mostrar a silhueta, a feminilidade acima de tudo”, explicou Manuel Alves após o desfile.
Também a apresentadora, atriz e modelo Cláudia Vieira destacou este lado feminino da coleção que, no entanto, fugia para um “estilo mais relax” – “Eu vestia muitas destas peças, não só no meu dia a dia, mas eu outras situações, como por exemplo nas galas do Factor X, que estão quase a começar.”
Asas cobriram o corpo de algumas manequins, em peças mais estruturadas que marcaram um contraste com os outros conjuntos de vestidos, saias e túnicas extremamente fluídas.
Penas, rendas e tecidos mais brilhantes tiveram também a sua vez na passerelle, numa coleção que “mexe com o vento”, como o colocou Manuel Alves.
Ainda no Museu, um edifício de estilo neoclássico projectado por Pierre-Joseph Pézerat, foram apresentadas as propostas Primavera Verão 2015 de TM Collection, o último desfile da noite.
“TantoMar” é uma coleção na qual “a tradição, luxo e modernidade se fundem numa perfeita sinergia”, mote que reflecte a identidade de marca.
Tecidos naturais, como algodões, linhos e sedas, marcados com estampados e bordados completamente exclusivos “transmitem uma silhueta fácil, moderna, urbana e muito sofisticada”, explicou Teresa Martins em comunicado. Em tons laranja, amarelos e pretos, mas também tonalidades como o infinito e a pedra, esta coleção segue uma “tendência chique, romântica e casual”.


Mais cedo no mesmo dia, uma música tribal ecoou pelo Teatro Thalia, um dos principais teatros lisboetas do séc. XIX que foi recuperado recentemente, e nomeado, em 2013, para os prémios do Museu de Design de Londres. Uma tribo de bruxas guerreiras de cara azul percorreu a passerelle, envergando os coordenados dos HIBU, um trio constituído por Marta Gonçalves, Gonçalo Páscoa e Nuno Sousa.
Tons crus e terra irromperam pela passerelle, interrompidos por liláses e mentas, num estilo streetwear andrógino – que é de facto o cerne da marca HIBU – do qual transpareciam as influências tribais que inspiraram a colecção.
Foi precisamente a ideia de algo “Cru” (o nome da colecção) que inspirou os três designers a trabalhar a dicotomia estrutura-fluidez, e tentar fazer com que o corpo humano, masculino ou feminino, coexista nesses dois espaços que podem funcionar juntos, explicou Gonçalo Páscoa após o desfile.
Os primeiros manequins surgiram em tons brancos que, do nada, foram ofuscados por um estampado lilás, e, mais tarde, tons terra suprimidos por uma tonalidade menta. Cores que pretendem lembrar o espectador do “que pode acontecer e do que existe” e que remetem para a possibilidade de algo novo, como explicaram os HIBU.
A colecção apresentou um estilo desconstruído e minimalista que, pela sua androginia, não apela a todos. Para os HIBU, o público português é algo difícil, talvez por falta de preparação, ao passo que “o público internacional é muito mais aberto a este tipo de coisas”, opinou Marta Gonçalves. Por enquanto, a maioria dos portugueses está apenas curiosa e a “apalpar terreno”, ainda a tentar perceber como funciona a estética inovadora da marca.
Para além disso, Nuno Sousa referiu também que “a moda de autor para o público português é algo muito recente”, e que se deve dar tempo ao tempo para que os portugueses percebam que “uma peça de autor não pode ter o mesmo preço de uma da Zara.”
À apresentação dos HIBU seguiram-se as manequins de João Melo Costa, ao som de uma música vibrante na qual “os sapatos, ao fazer barulho, pareciam gotas de água”, comentou Artur Araújo, o blogger responsável por artur in the woods.
A colecção intitulada “We have Plans” começou com coordenados de cores da Natureza e estampados de folhas e pássaros, em cortes algo rectos e estruturados, quase sóbrios. Tratava-se de planear, de “afastar tudo aquilo que não nos permite crescer ou evoluir”, como explica a folha de sala, e abrir assim caminho para a segunda parte da colecção, mais vibrante, com uma textura que saltava – literalmente – à vista.
Seguiram-se conjuntos que, para Artur Araújo, eram “coloridos e espalhafatosos (no bom sentido), peças que pareciam frágeis, o que [acaba por ter alguma] piada” – “mas não sei até que ponto é bom no sentido comercial.” Poderiam ser folhas de papel que cobriam os corpos das manequins, mas era na realidade uma mistura de seda, chiffon e organza, os únicos materiais utilizados pelo criador.
O Bloom terminou com a explosão de tonalidades e volumes de João Melo Costa, e deu lugar ao desfile romântico de Storytaylors, o duo de designers constituído por João Branco e Luís Sanchez.
“Voyage Voyage” é o segundo capítulo da História “Luz”, um conto sobre viagens, viajar e voar, que “tem a ver com as nossas experiências, com as nossas viagens interiores e físicas ao estrangeiro, com a descoberta de novos continentes e culturas”, esclareceu Luís Sanchez depois do desfile. É a terceira coleção apresentada sob esta história, “talvez a que vai concluir a trilogia [Luz]”.
O pôr do sol iluminou a passerelle, em tons que remetem para “momentos de introspeção, reflexão, romantismo e idealismo”, explicou Sanchez. Materiais como mousseline plissada, tule, pele e organza foram utilizados pelos designers de modo a construir este look composto por silhuetas que “representam a euforia de poder intervir e escolher, de poder usar o vestuário como um pintor usa um pincel, ou um poeta as palavras.”, como descrito na folha de sala.
Manequins envergando coordenados transparentes vinham e voltavam, marcando o que acabaria por ser uma das grandes tendências desta coleção. Para Sanchez, estas estavam relacionadas com “a forma como nós idealizamos as memórias que temos, que às vezes não são aquilo que nós vimos, mas aquilo que sentimos. [Estas transparências] são um patchwork de várias memórias, ou delas [misturadas com] emoções.”
Artúr Araújo, embora admitindo que não se identifica muito com a estética da marca, considerou esta coleção algo inconsistente, pois “havia demasiadas referências” e, para além disso, havia algum contraste entre as peças femininas e masculinas, uma vez que “as miúdas eram ladylike e os rapazes boyish”.
O Portugal Fashion deixou assim Lisboa e seguiu viagem até ao Porto, onde terminou ontem, com a participação de designers como Fátima Lopes, Luís Buchinho e Nuno Baltazar.