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A Clash of Kings: Um trono e cinco reis

A Game of Thrones foi para mim uma experiência de leitura bastante cativante e definitivamente capturou a minha constante atenção. A Clash of Kings, lançado pela primeira vez em 1998, foi isso e muito mais: desde a série Harry Potter que nenhuma outra série de livros me deixou tão empolgada durante a leitura.

(Aviso: esta crítica poderá conter spoilers, seja para os livros, seja para a série televisiva produzida pela HBO)

Na história de A Clash of Kings (em Portugal dividido em dois livros: A Fúria dos Reis + O Despertar da Magia), continuamos onde A Game of Thrones nos deixou. Um cometa vermelho é visto nos céus de toda a Westeros e o mesmo encontra os reinos no meio de uma Guerra Civil. Eddard Stark está morto e o seu filho Robb Stark, agora proclamado o ‘Rei no Norte’, lidera uma rebelião contra os Lannisters que agora detém o poder sobre King’s Landing. Joffrey Baratheon, de 13 anos, é agora o rei que se senta no trono de ferro, mas na realidade quem governa é a sua maquiavélica mãe, a rainha viúva Cercei. Entretanto, os irmãos do falecido rei Robert Baratheon, Stannis e Renly, visam reclamar o trono de ferro onde se sentara o seu irmão mais velho. Ambos proclmados reis e ambos pertencentes a lados opostos, reunem forças poderosas e estão dispostos a tudo para reclamar King’s Landing, mesmo que isso implique que tenham de lutar entre si. Além desses quatro ‘Reis’ existe ainda Balon Greyjoy, rei das Ilhas de Ferro, que planeia uma vingança contra aqueles que o humilharam há dez anos atrás. Entretanto, Daenerys Targaryen está a caminho de King’s Landing e do seu lado está não só o seu povo, mas também os seus três dragões que crescem cada vez mais com o passar dos dias.

Na minha anterior crítica pensava eu que A Game of Thrones fora uma história intrigante e interessante; contudo nesta continuação os elementos que tornaram o seu predecessor uma grande leutura são mais aprofundados e enaltencem esta nova parte da história: A Clash of Kings apresenta-nos um olhar mais aprofundado sobre as intrigas que reinam em King’s Landing, assim como nos apresenta um conflito entre reis, cada um com um objetivo em mente. Voltamos a seguir a perspetiva de várias personagens já introduzidas anteriormente na história: o anão Tyrion Lannister, que agora ocupa a posição temporária de ‘Mão do Rei’; Daenerys Targeryen, agora com 14 anos de idade; Catelyn Stark, deixada viúva na narrativa anterior; Sansa Stark, agora com 12 anos, e mantida refém pelo seu noivado com Joffrey; Arya Stark, 10 anos, e fugida de King’s Landing; Bran Stark, com 8 anos, aleijado e ainda em Winterfell; e Jon Snow, que agora tem 15 anos, e marcha para norte na companhia da Patrulha da Noite. Somos ainda introduzidos a duas novas personagens, cujas prespetivas nos permitem acompanhar melhor os passos de dois dos cinco reis: Davos Seaworth, ex-contrabandista, agora cavaleiro que serve lealmente o rei Stannis Baratheon e Theon Greyjoy, de 19 anos, filho de Balon Greyjoy e protegido de Eddard Stark desde os seus 10 anos de idade.

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Ilustrado por Zippo514 ©

 

Curiosamente, nenhum dos cinco reis mencionado nesta história tem capítulos que sigam os seus pontos de vista. Há é personagens que nos permitem conhecer um pouco melhor estes ‘governantes’: Davos permite-nos conhecer o rei Stannis; Theon permite-nos conhecer o seu pai o rei Balon; Catelyn Stark na sua história acompanha o rei Robb Stark e conhece ainda o rei Renly Baratheon e o rei Joffrey é referido nas histórias de Tyrion e Sansa. Cada um tem um objetivo diferente em mente: Balon Greyjoy pretende vingar-se dos Stark, após Ned Stark o ter humilhado há dez anos atrás; Stannis e Renly ambos pretendem o trono de ferro ocupado por Joffrey, que por sua vez apenas pretende ser rei, apesar da sua crueldade, imaturidade e falta de inteligência para governar um reino em conflito e em crescentes dívidas; Robb visa vingar o seu pai e derrubar os Lannister de um trono que não lhes pertence por direito.

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Ilustrado por Papsuev ©

Duas das personagens que defnitivamente capturaram a minha atenção, devendo eu dizer que se tornaram nos meus personagens favoritos ao longo desta sequência, foram Tyrion e Theon. O primeiro pela sua astúcia e riscos que corre quando se vê, figurativamente, no meio de um ninho de víboras. O pequeno Lannister é agora Mão do Rei na ausência do seu pai Tywin Lannister, e contrariamente a Eddard, escolhe cuidadosamente os passos que dá nas suas jogadas no seio de uma corte corrupta, por vezes efetuando ações pouco focadas na sua honra. A relação entre si e a sua irmã Cercei é bastante evidenciada, e o ódio que os dois sentem um pelo outro é sentido pelo modo como cada um encara o outro e também em cada palavra sarcástica ou insultuosa que ambos dirigem frequentemente um ao outro. Recordo-me somente de um momento em que estes dois irmãos tiveram um momento de harmonia, apenas para nos apercebermos de que esse momento foi parte de uma das jogadas de Tyrion. O anão, enquanto lida com as intrigas e conflitos da corte, tenta também manter Shae, a sua concubina, em segurança no meio de uma cidade onde há espiões em locais imporváveis. Perto do fim do livro, após o conflito em Blackwater, o ‘meio-homem’ acaba em péssimas circunstâncias, perdendo metade do seu nariz, ficando com uma feia cicatriz que lhe atravessa o rosto e lhe provoca dores horríveis, e ainda visivelmente atormentado com o seu primeiro amor aos 13 anos de idade.

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Ilustrado por Diener ©

Theon Greyjoy também tem um papel relevante a desempenhar nesta narrativa. O seu amigo Robb Stark envia-o de volta a sua casa por forma a tentar formar uma aliança com o seu pai e com a casa Greyjoy. No entanto, o seu pai, rancoroso contra os Stark, planeia uma vingança, pelo facto de Robert Baratheon e Eddard Stark terem detido uma rebelião sua. Balon acaba por engendrar um plano de vingança contra Winterfell, ao qual Theon não resiste em participar, pelo seu desejo de provar que merece ser o herdeiro da casa Greyjoy, e pela inveja que tem da sua irmã Asha, que zomba constantemente dele. No caso de Theon, a razão pela qual esta personagem me captou a atenção, foi pelo facto de apesar do seu feitio arrogante e da sua traição contra uma casa que o acolheu como se fosse um dos seus, Theon sabe que as suas ações não foram as melhores. Apesar do seu desejo de de redimir perto do fim, no final nota-se que a sua ganância e desejo de se afirmar acabam por lhe levar a melhor, acabando também por o atirar para uma situação que o fará perder tudo.

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Ilustrado por Tim Tsang ©

Outra boa personagem que convém mencionar é a pequena Arya Stark, que conseguiu escapar de King’s Landing e dirige-se para o Norte com um novo visual e um novo nome de Arry, o rapaz orfão (apesar de ela mais para frente vir a autilizar diferentes nomes). A criança, afetada por tudo o que lhe aconteceu e pela perda do seu pai, começa a desenvolver um desejo de assassinar aqueles que lhe fizeram mal de algum modo. Quando a pequena conhece Jaquen H’gar, durante a sua viagem ambos ficam unidos por uma dívida de mortes, que será paga após Arya chegar à fortaleza de Harrenhall, vivendo lá uma vida de escrava. A frase “Valar Morghulis” (“Todos os homens devem morrer”) tornar-se-à numa frase, e de certo modo numa moral, que acompanhará a jovem loba nas suas aventuras futuras.

Entretanto, em King’s Landing, Sansa Stark ainda é mantida como refém dos Lannister, sendo frequentemente espancada e humilhada pelo infantil rei Joffrey, e pela cínica rainha regente Cercei. Contudo a pequena vê um raio de esperança quando Dontos, o recém-nomeado bobo da corte promete ajudá-la eventualmente a escapar dos horrores e tirnaia em que ela vive. Sansa pouco é desenvolvida como personagem, apesar de aos poucos aprender que a desconfiança é por vezes a melhor forma de sobreviver a um ninho de víboras como King’s Landing. A tensão entre ela e Sandor Clegane nota-se sempre que ambos cruzam caminhos, mas no final ambos terão um pequeno momento de harmonia que ficará um segredo entre ambos.

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Ilustrado por Anja Dalisa ©
Davos Seaworth é-nos apresentado nesta nova narrativa, mas a sua personagem apenas é explorada no seu primeiro capítulo, expondo-nos a sua história como contrabandista e expondo a fidelidade que este detém para com Stannis Baratheon, apesar da sua arrogância e da sua nova religião encabeçada pela misteriosa e sinistra Melisandre (na qual Davos deposita uma grande desconfiança em relação às suas verdadeiras intenções).

Catelyn ao longo da história sofre enquanto viúva pelo seu falecido Ned, como filha, pelo seu pai que se encontra progressivamente a definhar aos poucos, e como mãe particularmente pelo seu primogénito Robb. Apesar de dar conselhos sábios ao seu filho, Catelyn não consegue controlar as suas ações como desejaria. O seu defeito de seguir mais o coração em vez da sua cabeça torna-se cada vez mais visível nesta sequência. Quando Cat é enviada até Renly Baratheon com o objetivo de discutir uma possível aliança entre Renly e o seu filho, ela acabará por presenciar o assassinato do jovem rei às mãos de uma sombra, que mais tarde descobrimos ter sido enviada por Melisandre.

Entretanto mais para norte, em Winterfell, Brandon Stark ainda se está a tentar conformar com a sua condição de aleijado, ao mesmo tempo que tenta decifrar os sonhos misteriosos que tem com um corvo de três olhos e com os seus frequentes “sonhos de lobo”. A chegada de Meera e Jojen Reed ajudará Bran a esclarecer aos poucos alguns dos seus sonhos e no fim o pequeno ver-se-à envolvido numa jornada para encontrar o ‘Corvo de Três Olhos’ que tanto aparece nos seus sonhos. Jon Snow, longe do conflito central da história, marcha para norte da muralha, com o objetivo de encontrar patrulheiros desaparecidos, entre os quais está o seu tio Benjen Stark. No final, após uma longa marcha, Jon no final ver-se-à obrigado a desempenhar um duplo papel, visto que a intriga também existe a norte da Muralha.

Quanto a Daenerys devo dizer que foi das personagens que me dececionou um bocado, tendo em conta o seu papel na obra anterior e nesta. Nada de absolutamente relevante acontece com a sua personagem à exceção do momento em que a herdeira dos Targaryen visita a House of The Undiyng, onde tem um vislumbre de coisas passadas e um presságio de eventos qua ainda estarão por acontecer. No fim da sua história, Dany consegue os navios que pretende para atravessar o mar, na sequência de um golpe de sorte que acaba também por lhe conceder dois novos aliados.

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Ilustrado por Tomasz Jedruszek. ©

Apesar de todos os conflitos que nos são retratados na história (que apenas nos são mencionados), aquele de que o leitor se irá realmente recordar é da batalha de Blackwater onde a astúcia, estratégia e liderança de Tyrion Lannister desempenham um papel fulcral até a ajuda a King’s Landing eventualmente chegar sob a forma dos exércitos de Tywin Lannister. Uma das cenas mais memoráveis e impressionantes desta batalha é o confronto entre as frotas de Stannis e Joffrey no rio, terminando num inferno impressionante de chamas verdes.

Esta narrativa acabou por se revelar mais complexa do que a sua predecessora: há várias histórias que ocorrem em locais diferentes de Westeros, algumas detêm influência no conflito central que assola os Sete Reinos, outras nem tanto. Aprofundou também aspetos como a intriga em King’s Landing, as motivações e emoções das personagens e as consequências das ações tomadas por determinadas personagens (por exemplo é descrita a pobreza que assola a plebe de King’s Landing desde que Joffrey deu início a todo o grande conflito). Muitas personagens ver-se-ão confrontadas com decisões flucrais e pessoais que terão certamente consequências futuras. A narrativa tem um ritmo razoável, apesar de ser mais lento na perspetiva de certas personagens.

George R. R. Martin sabe certamente como manter uma pessoa presa às páginas de A Song of Ice and Fire. Desde o começo até ao fim desta obra senti que tinha que saber ao que levariam as decisões das personagens da narrativa. A história é empolgante, interessante e com uma capacidade de prender o leitor às suas páginas até ao fim do livro. Estou absolutamente ansiosa por saber o que se seguirá em A Storm of Swords, que é considerado o livro favorito de muitos fãs das histórias intensas do mundo de Westeros.

 Nota: 9/10