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Omar: um amor entre barreiras

O candidato palestiniano ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro é uma pungente história de amor que reflete o estado do país e as consequências dos conflitos que nele se presenciam na vida normal dos seus habitantes. Omar é uma obra simples, delicada e emocionante, que estreia hoje em Portugal.

Omar é um rapaz habituado a passar clandestinamente o muro de separação para poder encontrar, do outro lado, a sua namorada secreta, de nome Nadia. Contudo, os sentimentos que os dois personagens sentem um pelo outro acabarão por ser condicionados pela guerra e por uma série de problemas sociais e políticos, que se sobrepõem ao amor que os une e criando reviravoltas inesperadas e perturbantes nas suas vidas e naqueles que os rodeiam. A Palestina ocupada destrói simplicidades e cria rivalidades, proporcionando outras lutas que tentam distanciar-se do conflito armado que está sempre tragicamente presente.

É a história deste jovem (interpretado por Adam Bakri) que dá o título ao novo filme de Hany Abu-Assad, realizador de O Paraíso, Agora! (outro nomeado ao mesmo prémio da Academia), que acompanhamos ao longo de pouco mais de hora e meia. Tal como essa multipremiada obra, o cineasta volta a debruçar-se sobre os problemas que marcam a atualidade palestiniana e israelita. E aliás, a forte veracidade da história, no que diz respeito à maneira como a ficção usa a turbulência causada pelos factos nestes países faz-nos cair na estranha sensação de que este filme parece ter sido feito “naquele” momento em que estamos a visioná-lo.

Contudo, o drama é adocicado com uma certa química e comicidade presente entre os atores, propício a gerar alguns momentos francamente hilariantes num filme que possui um background que nada tem que nos possa fazer rir. Mas não é por causa disso que nenhuma das intenções ativistas de Abu-Assad se desvanecem – pelo contrário, só ficam mais salientes na nossa memória, entre as gargalhadas e o choque que grande parte do filme nos suscita, nos momentos mais intensos e provocantes da sua trama, e nas contradições morais e familiares que terá de viver Omar e alguns dos seus amigos, lutadores da liberdade.

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A história de amor enternecedora acaba por não ser a parte mais interessante de Omar. Mas sejamos sinceros, será aquela que poderá dar um maior êxito internacionalizável ao filme (e talvez por isso tenha agradado tanto aos membros da Academia, que o recompensaram com essa nomeação ao prémio). É essa historieta com algo de Romeu e Julieta que puxará certamente por mais espectadores, e esperemos que assim aconteça, porque bem merece. E isso acaba só por ser uma camada superficial para Abu-Assad explorar todas as problemáticas que decorrem ao longo da ação da fita.

A força da (má) Lei, derivada de uma conduta política imprópria causada pela dura Ocupação, que impede o bem estar normal de uma sociedade, acaba por ser o tema central desta história de princípios, ética, amores, traições, choques emocionais e hierarquias que constroem uma noção de status que, para o bem e para o mal, é comum a todos os países do mundo (mesmo que seja usada de maneiras diferentes). Omar é um retrato imparcial e armadilhado do Real, que mostra o poder da paixão na tomada de decisões, superando-se aos valores e às amizades – implicando, por isso mesmo, uma panóplia de consequências para o protagonista a que não podemos ficar indiferentes.

A trama de denúncias e escape à dureza da vida mundana tem algo de Sidney Lumet, mas é o poderoso character study que mais se sobressai deste filme bem feito e cativante. Apesar de perder um pouco a noção do ritmo e da construção da sua própria história (provocando algumas incongruências notórias, de modo felizmente pouco demarcado, no cruzamento entre o romance e seus floreados sentimentalistas com a violência e os momentos de maior ação), Omar não deixará, com certeza, de tocar todos os tipos de espectador, pelas suas raízes humanas e envolventes que não nos deixam tirar os olhos do ecrã por um segundo que seja.

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Se neste tipo de situação, seguir o caminho governativo e os códigos de conduta não serão a melhor escolha para tentar sobreviver às adversidades do conflito, esta história de amor com drama social mostra-nos como nunca devemos baixar os braços, nunca cedendo aos rótulos americanizados que já foram tantas vezes utilizados para se passar esse tipo de mensagens filosóficas. Com magníficas interpretações e uma realização segura e criativa, Hany Abu-Assad conseguiu passar a palavra e, através do Cinema, mostrar-nos uma visão da realidade que a própria realidade não nos consegue transmitir por outros meios (sejam eles jornalísticos ou de qualquer outra índole), através desta história de fatalidades e imprevisibilidades humanas que nos faz pensar, e muito, nos dias conturbados em que vivemos.

8/10

Ficha Técnica:

Título: Omar

Realizador: Hany Abu-Assad

Argumento: Hany Abu-Assad

Elenco: Adam Bakri, Leem Lubany, Iyad Hoorani

Género: Drama. Thriller

Duração: 96 minutos