O primeiro evento Out of the Box, uma iniciativa da FWD Coop em parceria com a Caixa Económica Operária e A Comissão, realizou-se no passado dia 14 de fevereiro e não pôde deixar de fazer jus ao nome, em todos os sentidos, desde o programa àqueles que marcaram presença. Além da entrada paga, um valor de apenas cinco euros com direito a uma bebida, o único requisito foi ser-se fora do baralho, ainda que apenas por uma noite.
O Out of the Box//Cultura Urbana teve lugar na Caixa Económica Operária, um espaço amplo, com ar de palácio, que cativou logo de início, com pétalas espalhadas pelo rés-do-chão. No primeiro piso, o Espalha Factos foi recebido por membros da organização e encaminhado para os andares superiores. Às 22h30m, o segundo piso ainda estava fechado, embora houvesse uma projeção na parede das escadas a servir de fio condutor entre os dois andares, e os presentes encontravam-se reunidos no terceiro, a apreciar a exposição de ilustração de Mariana Cáceres e Nicolae Negura, o 3º número da revista GAU – Galeria de Arte Urbana, que foi oferecida gratuitamente (assim como pins com imagens do trabalho de alguns artistas produzido para a GAU), e a conversar animadamente, sobretudo junto ao bar.
As ilustrações de Mariana Cáceres, estudante na Faculdade de Belas-Artes, compõem-se de personagens distorcidas ausentes de expressão facial, mas é exatamente o insólito que cativa o olhar do espetador, podendo recriar a história que desejar a partir de olhares vazios, desfragmentações ou até mesmo braços a mais. Ao observar as ilustrações expostas, destaca-se uma figura disforme que manipula um cubo de Rubik, a imagem de marca do Out of the Box. Já Nicolae Negura transporta-nos para o universo dos Cavaleiros do Zodíaco, onde parece ter-se inspirado, com retratos fantásticos, como um homem-unicórnio, uma mulher-gata ou um ser invisível, onde se vislumbra apenas uma gola e um gorro.
Pouco tempo depois, os corpos e a curiosidade aproximam-se da mezzanine para poderem assistir ao concerto de Martin Henneken e Raquel Reis, como previsto no programa. Com uma tela no chão e dois violoncelos, tudo começa com uma projeção de imagens estelares pelo Edgar Oliveira, para de seguida os músicos aparecerem vestidos de preto e com cabeças de porco. Depois de uma luta entre arcos, caiem e tocam Bach deitados, impressionando os presentes, que são apanhados de surpresa com a aparição de Dani d’Emilia, vestida de bailarina com cabeça de ovelha, e aparentemente grávida, que os acompanha com uma performance artística. Entre música clássica e improvisos espásmicos, a bailarina acaba a dar à luz penas, seminua, numa situação frágil e maravilhosamente perturbadora. Um espetáculo capaz de transportar qualquer um para um universo mutante, que mereceu a incrível salva de palmas que surgiu após um demorado momento de silêncio.
Numa conversa posterior, a FWD Coop declarou que “a performance e o concerto foram pensados especificamente para aquele espaço, o facto de os músicos e a bailarina estarem deitados, pois a audiência foi restrita ao andar de cima (…) enquanto os artistas estavam no andar de baixo, criando uma espécie de quadro visual”. Na verdade, “foi tudo pensado e encaixado para fazer sentido dentro de uma noite que se queria de cultura urbana”, de modo que até foi necessária a compra de “estruturas em madeira para pregar os quadros [de Mariana Cáceres e Nicolae Negura], por exemplo”. Foi tudo planeado para “mostrar o trabalho destes artistas num contexto diferente do que estão habituados e (…) num contexto bem mais próximo do seu público-alvo”.
Das 24h até às 4h, houve tempo para votar no On Public Demand Lisbon, um crowdfunding para trazer bandas a Portugal por um preço mais justo, onde, dentro do leque de escolhas, figuravam nomes como XXYYXX, Soap & Skin, Passion Pit, Pond, London Grammar, entre outras; e para ouvir e dançar ao som de boa música, por Palmada DJset (Tiago Palma e António Almada Guerra) e Phizz DJset (Filipa Marta), com projeções de imagens dentro do estilo, da autoria da VJ Inês Sanches, enquanto era possível assistir ao live splatter de Tamara Alves. Desde música dançante, francesa, alternativa, e até hip-hop tuga, não faltou diversidade, nem a “projeção de um vídeo psicadélico feito por um artista que vive em Londres, o Roger Spy”. A multidão não foi suficiente para encher o palácio, mas cerca de 300 pessoas provaram a potencialidade de mais noites como esta. Cortes pixie por todo o lado, ares descontraídos e muita vontade de dançar, muitas vezes colados, não fosse também Dia de São Valentim.
A FWD Coop surgiu “depois de muitas reuniões em Santa Engrácia com chá e tarte de amêndoa”, entre seis pessoas, que inicialmente não se conheciam todas. “Foi com base no amigo puxa amigo, e os ingredientes certos foram o facto de termos a mesma vontade e empenho neste tipo de atividade”, conta Filipa Marta, acrescentando que este projeto “surgiu assim, entre mil conversas sobre sonhos e desejos de contribuir para o universo da música e artes performativas em Portugal” e, FWD é exatamente a abreviatura do termo forward que significa “levar as coisas para a frente, estar à frente”.
Sobre as sessões Out of the Box, a equipa confessa que achava que conseguiriam parceiros que os ajudassem a suportar de certa forma os custos de um projeto tão ambicioso “e não foi o caso mas o barco seguiu na mesma para a frente”, levando imensas pessoas para uma Graça molhada que recebeu um feedback bastante positivo. “As pessoas estavam satisfeitas e conseguiram apreciar tudo o que lhes foi dado, com um sorriso nos lábios” e, para a organização, “é uma sensação explosiva, o facto de estas 300 pessoas se terem deslocado nesse dia (…) e terem gostado”. A FWD Coop declara ainda que vem aí mais e que o público a quem se dirige “tem que ser literalmente out of the box, curioso e que procure algo diferente na saída para um copo com os amigos”, para que possam “espremer a noite no bom sentido”, até porque o que pretende com estas iniciativas é “criar uma espécie de alternativa à noite lisboeta, com determinadas escolhas culturais, unindo de certa forma as artes à música num espaço característico, com pequenos eventos pontuais”.
Atualmente, esta cooperativa cultural sem fins lucrativos dedica-se à promoção de eventos, divulgação cultural e agenciamento de artistas (como a DJ Phizz e o músico Fil The Captain). Está também a preparar um festival de cinema, o MUVI, “que ainda se encontra no segredo dos deuses mas a seu tempo será divulgada toda a informação”.