Os jornalistas do Libération, que estiveram em greve a semana passada, foram hoje notícia pela contestação que fizeram, em primeira página, às mudanças que os acionistas querem impôr no jornal.
Fundado em 1973 por Jean-Paul Sartre e Serge July, comemorou 40 anos em 2013 e é a publicação de referência para a esquerda francesa. No entanto, como em todo o mundo tem acontecido, as vendas dos exemplares em papel baixou para menos de 100 mil, o pior número em 15 anos.
As mudanças
Os baixos resultados apontados levaram a propostas de alteração por parte dos acionistas da empresa que detêm o diário. Pretendem a transformação física da sede do jornal, onde passarão a estar incluídos um espaço cultural, um centro de conferências com estúdios televisivos, uma rádio, uma redação digital, um bar e restaurante, bem como uma incubadora de start-ups.
De acordo com os acionistas, este é um modelo com “fortes perspetivas de crescimento“, com a sede do jornal a ser “um local totalmente dedicado ao universo Libération“, designado como “um fórum do século XXI com a pujança da marca do Libération“, onde toda a gente pode estar. Jornalistas, escritores, filósofos, políticos e artistas.
A falta de referências à continuidade da publicação nos moldes em que é conhecida, para além de um anunciado corte salarial, motivaram a contestação dos trabalhadores. Os acionistas dizem que “o jornal continuará a ser o coração do sistema, mas deixará de ser o sistema em si“.
A reação
Na passada quinta-feira os trabalhadores entraram em greve, discordando do novo projeto de desenvolvimento para a empresa. A jornada de luta contou com a participação de 81,2% dos assalariados, sendo que está anunciada nova paralização para domingo. Os jornalistas admitem as “graves dificuldades financeiras“, que relacionam com “a crise da imprensa escrita“, mas acima de tudo com “um sério problema de governança“, apontando o dedo à direção comercial do jornal, de Nicolas Demorand e Phillipe Nicolas, que 89,9% quiseram, em novembro, que se demitisse.
Na edição de hoje, os jornalistas acusam os acionistas de quererem um Libération sem Libération e de terem ignorado, ao longo dos últimos três meses, os vários alertas feitos pela equipa redatorial, que quer “um plano de desenvolvimento realista, que passe por uma reestruturação a longo prazo da empresa e um projeto editorial ambicioso, que se encontre com as expetativas dos seus leitores“.
Os jornalistas acreditam que o esforço incidirá maioritariamente na baixa de salários e na redução do horário de fecho da edição das 21h30 para as 20h00, o que consideram “constituir um risco real para a qualidade do Libération“. Dizem ainda que acontecerá o esvaziamento da redação, com reformas antecipadas e substituição dos profissionais por estudantes não pagos pelo exercício da profissão.
Dizem que o plano passa por “fechar o jornal, mas manter o bonito logótipo“, “demitir os jornalistas e rentabilizar a marca”, naquilo que classificam como “um putsch dos acionistas contra o Libération, a sua história, a sua equipa e os seus valores“. “Um losango vermelho sem nada por trás, dez letras que não significam mais nada“, a transformação do Libération num “Libéland, Libémarket, Libéworld“. A greve de domingo é para uns “ultracoerente”, para outros “suicida”.
Resta saber se, passados 40 anos de história, a informação vencerá o combate.