2013 foi, acima de tudo, um ano marcado por regressos ao ativo. Nomes como Kanye West, Queens of the Stone Age, David Bowie, Arcade Fire ou My Bloody Valentine, todos estes regressaram, de forma mais ou menos inesperada, com registos que conquistaram (ou não) os corações dos fãs.
Porém, 2013 teve muito mais do que comebacks. E é por isso que, mais do que regressos triunfais de velhas glórias, a nossa lista, escolhida a custo com muito suor, inclui também alguns nomes menos sonantes que nos apanharam de surpresa, algumas caras jovens e, aqui e ali, gente que nos tem dado alegrias de uma forma consistente, sem nos dar tempo para respirar. Preparem-se bem, aqui fica o nosso top 10 de discos internacionais de 2013:
10. Lighting Bolt, de Pearl Jam
Qualquer projeto dos Pearl Jam é um motivo para festejar, quer seja um documentário, um concerto ou, especialmente, um álbum. Com Lightning Bolt, o primeiro trabalho de originais da banda desde Backspacer, de 2009, podemos ver o verdadeiro espírito que inicialmente nos levou a ouvir Pearl Jam, um amor puro pelo rock. Quando bandas como esta, que já contam com vários álbuns e sucessos no seu currículo, lançam trabalhos mais atuais, surgem sempre os fãs que querem a versão “original” dos artistas, ou seja, a cada álbum haverá sempre alguém que se irá queixar porque aqueles não são os “velhos Pearl Jam” de Ten. Garanto já aqui que o que se ouve em Lightning Bolt não é um Ten 2.0, mas sim uma versão mais adulta e madura disso, uns Pearl Jam modernos e experimentais que não voltaram as costas ao estilo musical que os tornou conhecidos nos quatro cantos do mundo. Ao longo das 12 faixas do trabalho podem-se ouvir influências do hard rock, como é o caso de Getaway, temos sons mais diferentes e frescos em músicas como Pendulum e ainda as habituais baladas como Sirens, todas elas e mais algumas que, daqui a alguns anos, poderão ser conhecidas como clássicos. É o melhor álbum dos Pearl Jam? Talvez não, mas é o melhor que nos deram nos últimos anos e, sinceramente, chega para os pôr entre os melhores álbuns que saíram para o mercado em 2013. JPP
9. Repave, de Volcano Choir
É o segundo registo do projeto de Justin Vernon como Volcano Choir, mas já sabíamos desde Bon Iver que este senhor não pode ser perdido de audição nem afastado dos corações. Volcano Choir é o sexteto que o junta ao post-rock dos Collections of Colonies of Bees e Repave traz o selo da Jagjaguwar e isso não é pouco. Situa-se no indie folk mas usa e abusa dos sons mais experimentais, invocando uma atmosfera onírica e emotiva. Tiderays, Comrade e Byegone arrepiam até ao último pelo muito graças ao timbre fabuloso de Vernon, mas também à instrumentalização fabulosa e por vezes revolta como o mar que surge na capa do disco. AS
8. One Track Mind, de Psychic Ills
Ditosa pátria que tais filhos tem, a editora Sacred Bones. É dela que têm saído, como linha de montagem, os melhores discos dos últimos anos. The Men, Moon Duo, Föllakzoid, Pop. 1280, Zola Jesus, Amen Dunes, para nomear alguns, e, claro está, os Psychic Ills. A banda volta a construir um álbum acessível aos ouvidos mais ortodoxos, uma tendência que teve início em Hazed Dream, de 2011. Deixam o experimentalismo das paredes de som e dos drones dos primeiros três álbuns para continuar a escrever canções com um travo a psych-blues, um disco que se desenrola lento e compassado, sem pressa, riffs longos, de guitarra e baixo, com cheiro a stoner rock, letras de um estoicismo desanimado e distraído, que anulam as más avaliações da imprensa entendida. JB
7. Paracosm, de Washed Out
Aos primeiros segundos de Entrance apercebemo-nos, através do chilrear dos pássaros e dos sons da floresta, que acabámos de entrar num verdadeiro Jardim do Éden, concebido pela mente de Ernest Greene, mais conhecido por Washed Out. Paracosm, segundo LP do norte-americano, chuta o chillwave dos primeiros registos para um canto e aposta numa sonoridade mais próxima da synthpop e da dream pop tradicionais, com um som mais analógico e “preso à terra”. Cheio de luz e de sol, repleto de uma energia incompreensivelmente alegre, Paracosm é a vitória da felicidade sobre a tristeza, um hino a tudo o que há de bom neste mundo. Tendo dado um salto tão gigantesco da estética de Within and Without (2011) para a deste seu segundo álbum, Washed Out assina, conjuntamente com Ben H. Allen, uma produção perfeita e afirma-se, de uma vez por todas, como um nome incontornável da música indie atual. JM
6. Muchacho, de Phosphorescent
Tinha passado despercebido no nosso país até Muchacho, sexto longa duração do projeto de Matthew Houck que brindou 2013 com um disco de uma profundidade assoberbante. Toca no country com a alma que se lhe pede, mas dá-lhe laivos de psicadelismo sem deixar de parte o indie “choninhas”, com arranjos trabalhados e letras acutilantes, por vezes quase espirituais. Assim é na desconcertante Song for Zula (definitivamente a música que mais ouvi este ano), que nos despedaça o coração. Terror In The Canyons (The Wounded Master) explora o mundo que Houck quer cantar, a paisagem árida que lhe deu o country, a barba e a camisa de flanela. Não se pode ainda deixar de ouvir a penetrante The Quotidian Beasts, que narra um pouco do que somos todos nós. Mas é sobretudo um disco de canções que aponta setas diretas ao coração e que não podemos, nem devemos, deixar de ouvir no seu todo, porque até inclui um prólogo (Sun, Arise! (An Invocation, An Introduction)) e um epílogo (Sun’s Arising (A Koan, An Exit)). AS
5. Reflektor, de Arcade Fire
Os Arcade Fire são uma daquelas bandas que nunca desilude. Com mais de 10 anos de experiência, mau era se o fizessem. O que eles podem fazer é levar os fãs por novos caminhos, novas experiências. Com Reflektor eles fizeram exatamente isso. Adotando o formato de disco duplo para este lançamento, o álbum não perde qualquer coerência e podemos ouvir peças tão boas como as de Funeral, Neon Bible ou The Suburbs. Apesar de tudo, é discutível se, das quatro obras, esta não é a mais fraca, mas, mesmo assim, Reflektor não deixa de impressionar e fornece-nos grandes momentos ao longo de mais de uma hora. Olhando para as duas metades do disco, creio que seria mais correto ver a primeira parte como um conjunto de faixas bem mais influenciadas pelo lado mais rock dos Arcade Fire, enquanto a segunda parte, mais intimista, tanto ao nível instrumental como lírico, revela uma necessidade de maior cuidado e atenção. Quanto ao “preferido”, cada um há de ter os seus gostos (pessoalmente, prefiro o primeiro), mas, no seu todo, Reflektor prova que os Arcade Fire se mantêm consistentes em dar ao cenário da música o melhor do indie rock. JPP
4. Government Plates, de Death Grips
Quando o inesperado acontece, os Death Grips lançam um álbum sem que ninguém espere: assim foi no ano passado com a polémica edição de No Love Deep Web (que culminou com o corte de relações com a sua editora discográfica na altura), assim foi este ano quando do nada se fez sair ao mundo Government Plates. A sua estratégia de marketing é irrefutavelmente peculiar e só isso torna o trio composto por Zach Hill, MC Ride e Flatlander um caso idiossincrático no panorama musical global. Quanto à música, idem: é legítimo dizer-se que antes de os Death Grips existirem já existia uma exploração que aliasse o noise ao hip-hop, mas a verdade é que foram eles os grandes vitoriosos dessa aliança. Government Plates, na opinião deste escriba, para além de melhor álbum dos norte-americanos, é o grande álbum do ano que agora se vai e a explicação é fácil: nunca ouvimos um álbum que conjugasse electronica, noise e hip-hop que nos desse tanta vontade de borrar a cueca ao mesmo tempo que nos faz sorrir de satisfação. Assim é Whatever I Want (Fuck Who’s Watching), assim é Government Plates. EG
3. Trouble Will Find Me, de The National
Matt Berninger terá dito que os portugueses gostam tanto da música que os The National fazem porque andamos todos “horny and sad”. Não vale a pena discordar: o último álbum destes senhores ascendeu aos cumes do top de vendas nacional, conseguindo juntar uns largos milhares de pessoas na MEO Arena, em novembro, para um concerto que muitos dizem inesquecível. A nossa “portugalidade” fascina-se com as “sad songs for dirty lovers” dos The National. Trouble Will Find Me é um disco emocional que se vai entendendo. A voz de barítono de Matt, que parece ter sido forjada nas fornalhas de Mordor, fala de mortificação e penitência. É uma melancolia com razão, cantada racionalmente. A elegância dos vocais ecoa na suavidade das melodias que, podendo não chegar como novidade, resultam. É uma afirmação, antes de ser uma repetição. É um disco de exorcismo. E nós escutamo-lo com um aperto – ou com a completa noção de um entendimento doloroso. JB
2. Overgrown, de James Blake
Talento britânico precoce da música electrónica, James Blake traz-nos em Overgrown o maior exemplo de quem arrisca pode mesmo petiscar. Inevitavelmente diferente do seu homónimo, editado dois anos antes, Overgrown alberga consigo o passado de James Blake em muito intimidado com o dubstep, as aventuras tímidas pelos territórios da música soul, onde a sua voz, magistral, é o fio condutor que nos transporta para lá, mas, além disso, relembra-nos que mais do que um artista do, e para o, presente, James é um artista do futuro: Voyeur e o chamariz que lá se faz à música house e às pistas de dança salientam-no bem. O aviso está dado, resta-nos ganhar consciência disso. EG
1. Yeezus, de Kanye West
Yeezus tinha tudo para correr mal. Depois de um monólito tão imponente quanto My Beautiful Dark Twisted Fantasy (2010), estrela maior da constelação brilhante que é a discografia de Kanye West, parecia impossível haver espaço para o norte-americano se superar. E por isso mesmo é que West, do alto da sua genialidade, decidiu inverter o jogo, trocar-nos as voltas e mudar toda a sua roupagem. Despindo-se de toda a luxúria e volúpia da produção do seu quinto disco, Yeezy decidiu regressar a um minimalismo semelhante ao de 808s& Heartbreak, munido apenas de caixas de ritmos, loops e samples, sintetizadores e voz, juntando-lhe uma atitude muito mais confrontativa e uma estética agressiva, direta e abrasiva. O resultado é um disco tremendamente experimental, ciente dos avanços feitos no hip-hop mais left-field de grupos como dälek ou, mais recentemente, Death Grips, mas perfeitamente enquadrado na eterna ambição de Kanye de reinventar e trazer novos mundos ao mundo do hip-hop mainstream. Do ponto de vista lírico, o rapper não perde de vista as temáticas de sempre, com maior destaque para a sempiterna questão racial, mas aqui, no seu sexto LP, vemos um West bem mais ácido, a esfregar o sal na ferida com uma entrega vociferada, um flow idiossincrático e uns versos memoráveis (ainda que, pontualmente, pelos motivos mais cómicos). Em suma, Yeezus é um disco difícil e que dá luta, pelo que não é para os ouvidos de todos. Mas todas as ideias que estão por detrás da sua conceção, aliadas à brilhante execução e à memorável produção de West e dos seus comparsas, fazem dele um disco de exceção. Uma brilhante obra, vinda da brilhante mente de um homem que, cada vez mais, se assume como a nova bitola da música pop contemporânea. JM
Este top foi feito com as votações e os textos de Alexandra Silva, Emanuel Graça, João Biscaia, João Morais e João Pedro Peixoto.