Morreu na passada terça-feira à tarde Luna Andermatt. Nascida em 1926, Andermatt fundou a Companhia Nacional de Bailado em 1976, foi responsável pela reforma da dança em Portugal e pelas suas mãos passaram muitos dos bailarinos e coreógrafos que depois dançariam na CNB e no Ballet Gulbenkian.
Filha de boas famílias, educada com rigor e disciplina, Luna mostrou-se uma rebelde que optou por uma área nada sensata na sua época: a dança. Inscreveu-se em segredo no conservatório e aos 24 anos foi para Londres, onde trabalhou com grandes mestres e aprendeu as técnicas de ensino do ballet. No entando, viu-se num novo mundo e aproveitou para apreender tudo aquilo que Lisboa não lhe dava: “Estive lá um ano e adorei. Falava o inglês fundamental, mas vivia sôfrega de tudo quanto via. Bebia tudo quanto havia e podia, mesmo se a minha vida era escola-casa-cama. Depois das aulas, que começavam às oito da manhã, ainda tinha aulas particulares.” disse ao Público.
Quando regressou começou a tentar dignificar a dança em Portugal: formar bailarinos profissionais, criar uma companhia nacional, mas essencialmente cultivar o gosto por esta arte. Para realizar o seu sonho foi fundamental o seu marido Francisco de Brás Oliveira, sendo que finalmente em 1976 a dança tornou-se finalmente assunto de Estado. David Mourão Ferreira, o então secretário de Estado da Cultura, chamou-a para reavivar o seu projeto e criar a Companhia Nacional de Bailado, ao lado de Armando Jorge, Vera Varela Cid e Pedro Risques Pereira.
Foi diretora da Companhia durante sete anos, mas nunca parou de dançar ou coreografar. Mas era ao ensino que Luna Andermatt mais se dedicava: “Tenho muito orgulho em lhes ouvir dizer que não aprenderam só a técnica do bailado, mas a expressão do próprio corpo. É preciso ser-se atento a muitas coisas ligadas à pessoa, à espiritualidade, é preciso trabalhar todos os dias, e as coisas não são feitas ao som do relógio.” confessou ao também ao jornal Público.
Aos 83 anos aceitou o desafio e subiu ao palco com a companhia Maior com o espetáculo Durações de um minuto, uma co-produção da sua filha Clara Andermatt e Marco Martins. Num universo totalmente novo para si, pôs de parte o ballet clássico e enfrentou descalça a dança contemporânea. Apesar dos problemas da coluna e da perna esquerda traidora fez parte de mais dois projetos da companhia Maior. Como a própria escreveu: “Ninguém envelhece só por viver muitos anos. A juventude não é uma época da vida, é um estado da alma. não é uma questão de faces lisas, lábios vermelhos e joelhos bonitos. é uma força de querer, uma qualidade da imaginação um rigor de emoções e uma frescura da profunda primavera da vida“.
Em maio deste ano foi homenageado pela Câmara Municipal de Lisboa com a medalha de ouro da cidade e sem esquecer aquilo que desde sempre a moveu disse que só dançando poderia agradecer a tal homenagem.
Bailarina, professora, coreógrafa, impulsionadora da dança Portugal, Luna Andermatt é um nome incontornável no panorama da dança nacional e um exemplo de que os sonhos não são impossíveis de realizar.