Enquadrado na programação do CCBeat, o Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém recebeu, no passado sábado, Norberto Lobo e Lula Pena para dois concertos a solo. No palco aguardava-nos uma cadeira, sozinha à boca de cena, num espaço despido de artefactos, já que a música destes dois artistas fala perfeitamente sozinha.
Norberto Lobo entra em cena com a sua guitarra e, revelando-se um homem de poucas palavras, começa a tocar. Não foram precisos muitos acordes para o público do CCB se aperceber do virtuoso que estava à sua frente. Entre temas como Lúcia Lima ou Vudu Xaile, Norberto Lobo e a sua guitarra unem-se numa troca de prazer da qual resultam melodias extraordinárias.
A cada corda dedilhada, a vontade de fechar os olhos e viajar através das canções torna-se cada vez maior. Contudo, houve quem no público contrariasse essa tendência, ficando estupefacto com as capacidades do guitarrista e comentando “Mas como é que ele consegue fazer aquilo?!”.
A cada pausa para os aplausos, Norberto Lobo limitava-se a acenar a cabeça, em jeito de vénia. Tratou-se de um concerto mudo, capaz de nos provar que não são precisas palavras para se expressar sentimentos e emoções. Sozinho, com a sua guitarra, Norberto conseguiu encher o palco tão bem ou melhor que vários músicos e instrumentos.
No penúltimo tema, a guitarra foi trocada por um bandolim, produtor de um mantra capaz de nos fazer percorrer o mundo sem sair do Pequeno Auditório.
Seguiu-se Lula Pena. A fadista lisboeta também fez da guitarra a rainha do seu espectáculo, apresentando-nos temas do seu álbum Troubadour, divididos em atos. Cada tema de Lula Pena é uma história, uma viagem por vários idiomas (português, português do Brasil, inglês, francês e castelhano) e por vários estilos musicais.
Os temas de Lula Pena deambulam entre o fado e a bossa nova, passando pelo cancioneiro popular português. Entre as suas canções é possível identificar os refrões de Cantiga do Maio, Fui à fonte beber água ou Foi por vontade de Deus.
A sua voz doce e a forma peculiar de encarar a guitarra fazem de Lula Pena uma artista singular e com um estilo totalmente fora do comum.
No final do espetáculo houve tempo para um tema novo de Lula, uma canção que ainda está em formação “na incubadora”, acompanhado de improviso à guitarra por Norberto Lobo.
Depois de dois espetáculos únicos, com a guitarra no papel de protagonista, é impossível não nos lembrarmos do falecido guitarrista Carlos Paredes, que em vida disse: “Já me tem sucedido fazer as pessoas chorar enquanto eu toco…E eu não compreendia isto. mas depois percebi que é a sonoridade da guitarra, mais do que a música que se toca ou como se toca, que emociona as pessoas.”
É com um patriótico orgulho que, depois destes espectáculos, constatamos que Carlos Paredes tem belíssimos sucessores. A sonoridade da guitarra continua a “emocionar as pessoas” e a provar que, sem palavras, se diz muito.