Formados em Coimbra em 1999, os Wraygunn são um grupo liderado por Paulo Furtado (aka The Legendary Tigerman), Selma Uamusse e Raquel Ralha (Belle Chase Hotel), e que desde o seu início que se dedica à criação de uma sonoridade com base numa agradável fusão do Rock, da Soul e do Blues. Cinco anos depois do muito bem-sucedido terceiro LP, Shangri-La (2007), chega-nos a quarta obra do grupo, L’Art Brut, nas lojas desde 12 de Março.
Apesar de uma primorosa estreia com Soul Jam (2001) e de um magnífico follow-up com Ecclesiastes 1.11 (2005), foi só com o terceiro LP, Shangri-La (2007), que os Wraygunn conseguiram atingir um patamar mais alargado de popularidade, algo que está relacionado com os mui orelhudos singles extraídos desse álbum, e que se espalharam de forma quase viral (com She’s a Go-Go Dancer ou Love Letters from a Muthafucka a permanecerem, ainda hoje, bem firmes na memória).
Como se isso não bastasse para manter bem altas as expectativas para um quarto lançamento do grupo, acrescente-se também um interregno de 5 anos (muito bem aproveitado pelo The Legendary Tigerman) que só serviu para elevar a antecipação dos fãs, entre os quais eu me incluo, para níveis astronómicos. E foi com bastante agrado que constatei, após várias e repetidas audições, que os Wraygunn conseguiram satisfazer a minha ânsia de novo material; L’Art Brut pode não ser uma obra-prima, mas é certamente um esplêndido álbum.
Trazendo a maior mudança na sonoridade do grupo desde a sua formação, L’Art Brut mostra-nos uns Wraygunn que apostam muito menos na componente Soul da sua sonoridade e que investem numa mistura mais simples de Rock com Blues. Blues esse que também se vê transfigurado; se antes era um “black folk” Blues, mais ligado às tradições sulistas do género, agora é muito “white man” Blues, mais depurado e clean. Isso faz com que o som geral dos Wraygunn, que antes poderia ser uma banda-sonora apropriada para uma “putas e vinho verde lifestyle”, passe a ser mais cuidado e refinado.
Ao nível das letras, também se nota um maior aprumo. Apesar de não estarem aqui nenhuns tratados poéticos, vemos nas letras de L’Art Brut uma maior atenção em fazer música pensada para fazer pensar. A par da componente lírica, também a secção vocal ganha nova relevância, e mostra uma maior dinâmica entre os três vocalistas do grupo. Ao nível da estética, nota-se uma maior sensibilidade Pop, e que é combinada com uma produção muito bluesy e artesanal e um uso extensivo de reverb, tudo componentes que me agradaram bastante.
Porém, também se notam em L’Art Brut alguns aspectos menos positivos que merecem ser considerados. A encabeçar a lista de “defeitos” está uma certa perda de energia e efusividade da música quando comparamos o disco com os seus antecessores, especialmente com Shangri-La. Isso, aliado a uma certa inconsistência e a uma falta de brio em algumas secções do álbum, faz com que L’Art Brut não seja uma obra perfeita.
Quanto aos pontos fortes deste disco, canções como a catchy e sedutora Don’t You Wanna Dance, a quente e directa Kerosene Honey, a gingona e analógica I Bet It All On You, a poderosa e cativante I Wanna Go (Where the Grass is Green) ou a suave e voluptuosa I’m for Real são, a meu ver, escolhas óbvias. No que toca aos pontos fracos de L’Art Brut, Tales of Love, That Cigarette Keeps Burning ou I Fear What’s In Here são as peças que aponto como menos conseguidas e que desnivelam um pouco o álbum.
Em suma, em L’Art Brut os Wraygunn trazem-nos um som diferente daquele a que nos habituaram. No entanto, e apesar de mudarem a fórmula e de mostrarem algumas influências vindas do projecto a solo de Paulo Furtado, o grupo não altera em nada a chancela de qualidade que caracteriza os seus trabalhos. Mesmo tendo alguns pontos menos bons, L’Art Brut é uma obra sólida e muito bem conseguida, que vem mais uma vez provar que os Wraygunn são uma das melhores bandas que temos neste país. Agora é só esperar que pinguem mais álbuns, de preferência com menos tempo de intervalo, para não ficarmos esfomeados.
Nota Final: 8,3/10
*Por opção do autor, este artigo foi escrito segundo as normas do Acordo Ortográfico de 1945