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Optimus Discos 2012: Cais do Sodré

Cais do Sodré bem frequentado com boa música portuguesa. Na noite de apresentação da nova gama de artistas da Optimus Discos, destaque muito positivo para The Doups.

Pontualidade britânica e sala cheia em todos os concertos. Chegámos a tempo de ouvir as últimas músicas do alegre Lucas Bora Bora na Pensão Amor, numa altura em que a fila já era desencorajadora.

Seguiram-se The Poppers, contratação de luxo da Optimus Discos. Sabendo que não havia tempo para muito, entraram sem cerimónias e a todo o gás. Raimundo não deixou os seus créditos por mãos alheias: surpreendeu a plateia ao sair do palco e, em Dogsom Blues, emprestou a guitarra a uma rapariga – «Juro que não a conheço!» -, posicionou-lhe a mão dos acordes e deixou-a brilhar. Com a incisiva Mrs. A e comentários que se atiram em concertos de rock ‘n’ roll pelo meio, despedem-se com Drynamill – a música que «nos tornou milionários» e que todos souberam acompanhar.

Miuda. Mel do Monte sobe ao palco mais envergonhada, a seu jeito, acompanhada pelo seu mentor musical, Pedro Puppe. Num formato mais despido, soou ainda mais límpida a voz terna da miúda alentejana. O que falta nas letras é compensado pela profundidade do seu olhar e a sua elegância. As variações de Onde me posso esconder e Meu amor merecem destaque, porque romperam com um ritmo quase sempre demasiado monótono. Qual cliché, Com quem eu quero fica para o fim; a única que voltou a fazer estremecer o soalho da Pensão.

Interessante o constante olhar de orgulho e aprovação de Pedro Puppe, como que um patriarca atento, durante toda aquela meia-hora. Já com o concerto acabado, respondendo a um rapaz que lhe pede para dormir com ela, Mel do Monte realça «Eu durmo com quem EU quero!». Sim, foi o melhor momento que nos proporcionou. Nota: resistimos e não fizemos nenhum trocadilho com “Pensão Amor” e “Miuda”.

Miuda na Pensão Amor | Catarina Limão / Antena 3

A exiguidade dos corpos já era esperada e à meia-noite a rua já estava “intransitável”, repleta de caras de frustação, dignas de quem esperou e esperou para no final não ver nada. E assim foi durante toda a noite, tanto dentro como fora de cada uma das 5 salas.

Com um Musicbox lotado para os receber, os Souls of Fire chegaram, viram e venceram. Aquela que é considerada uma das melhores bandas nacionais de reggae precisou de apenas meia hora – tempo concedido a cada grupo – para conquistar os mais cépticos e reforçar o sentimento de partilha e união com os que os acompanham desde 2006. Aguerridos e comunicativos, os sete magníficos espalharam o ritmo jamaicano que lhes corre no sangue, contagiando o público com uma alegria e descontração que fluía por todo o espaço.

Num concerto dedicado à apresentação do seu novo trabalho, Pontas Soltas, editado pela Optimus Discos, o conjunto formado no Porto deu a conhecer temas como Lógica, num registo reggae roots, relaxado e com boa vibe, e É o que é, o seu primeiro single, onde a guitarra impera e os desvia da sonoridade a que já nos habituaram. «Como é Lisboa, vamos a isto, a mexer», aconselhava Diogo, o vocalista. E os presentes obedeciam, porque o som assim os obrigava. É impossível ficar-se indiferente ao chamamento tribal e libertário destes rapazes. O Musicbox não lhes resistiu, e atingiu a recta final do concerto com um mar de braços no ar, sincopados com a suave mas inquietante melodia que por ali voava.

Era hora de ir matar a curiosidade ao Lounge: The Doups, a tocar ao nível do público, davam início a um dos melhores momentos da noite. A sala a rebentar pelas costuras e toda a gente a delirar com guitarradas de mestre, sempre suportadas por uma brilhante bateria. Tudo correu bem aos setubalenses num concerto em que até uma falha da luz pareceu, à primeira vista, propositada: cantávamos então o refrão de I Said. Com toda a gente a pedir mais, o concerto acaba mesmo com Joyful«Não nos deixam tocar mais. Prometemos outro concerto em Lisboa dentro de muito pouco tempo!». Smalltown Gossip já não é só uma promessa.

Chullage no Europa | Catarina Limão / Antena 3

Num Europa pleno de admiradores e curiosos, Chullage, o rapper português da Arrentela foi um forte concorrente ao prémio de mais entusiasmante e emocionante artista da noite. Com uma sólida e reflectida mensagem, Chullage assume-se como um anti-sistema, um lutador pelo derrube do capitalismo, pela libertação dos seus. Sem medo de ferir susceptibilidades ou violar convenções, o rapper inicia a actuação com o tema De volta, aquecendo o ambiente e despoletando os primeiros aplausos. Segue caminho, comunicando incessantemente com o público. «Eu faço parto do milhão e duzentos mil que estão sem trabalho. Se estamos desempregados não é por não querermos trabalhar, mas sim porque não nos dão emprego».

Barrigas vazias é a música que logo se ouve, com o seu inconfundível beat, com a sua irrepreensível letra. Prossegue a apresentação do seu último trabalho, Rapressão, editado pela Optimus Discos, estremecendo com o tema Problema Social, que antecede Já não dá, a música que choca e apaixona, e que deixa os presentes em êxtase. Controverso mas assertivo, sem tento na língua, abre consciências e eleva espíritos. Uma mensagem de inconformismo e revolta, de inquietação e esperança. Esperança num mundo diferente.

No Musicbox, provavelmente o nome mais esperado da noite. O que é feito d’Os Pontos Negros? Ainda com o ego inchado depois da gravação do novo álbum em Londres, houve bons momentos – o novo single, Tudo Floresce, fica no ouvido -, mas regra geral não nos conseguiram conquistar. Quando se despedem com um «boa noite» seco, suspeitamos que teremos o primeiro encore da noite. Mas não, foi mesmo a pinta de vedeta que falou mais alto. Insistimos na opinião: ainda não conseguiram superar, em qualidade, o primeiro álbum.

Depois da D’Bandada no Porto, em Outubro do ano transacto, a Optimus Discos volta a alcançar sucesso semelhante. MusicBox, Lounge, Pensão Amor, Velha Senhora e Europa foram os anfitriões dos espectáculos, cuja entrada livre serviu de engodo para os milhares que invadiram o Cais do Sodré. No final da noite, e perante o claro êxito do evento, pareceu-nos que a Optimus Discos continua a investir no que de melhor se faz em Portugal, funcionando como um excelente mediador entre os grupos e o público.

Texto por Daniel Veloso, Francisco Morgado Gomes e Pedro Rebelo Pereira