A noite de sexta-feira, 13, fica marcada pelo início da programação cinematográfica da 5ª edição do 8 ½ Festa do Cinema Italiano.
O Cinema Monumental foi o local escolhido para a sessão de abertura que contou não com um filme falado em italiano, mas em inglês. A película contudo tinha mão italiana, não fosse ela realizada por Paolo Sorrentino – Este é o meu lugar. A recetividade ao festival era notória: não restava um único lugar desocupado na sala de cinema.
A poucas ruas dali, no Espaço Nimas, dava-se início à secção competitiva com a estreia de Ruggine, de Daniele Gaglianone.
THIS MUST BE THE PLACE – ESTE É O MEU LUGAR – 7,5/10
This must be the place, no título português Este é o meu lugar, tem assinatura de Paolo Sorrentino, um dos grandes homenageados desta edição do 8 ½ . O realizador faz a sua primeira incursão em Hollywood com o filme que retrata uma rock star reformada, Cheyenne, interpretada por Sean Penn, que vai procurar através de uma viagem descobrir-se a si próprio e ao pai com quem poucas relações estabeleceu.
Apesar do filme apresentar muitos e variados momentos de bom humor, é uma carga melancólica que persiste ao longo de toda a ação. Sean Penn é o responsável por esta carga emocional presente no filme, através da sua personagem que luta por um processo de definição de si própria. É impossível não sentir que Cheyenne está incompleto, triste – mesmo quando surgem as piadas, a personagem de Sean Penn é quase uma cerca que não pode ser transposta. Todas as restantes interpretações estão sólidas e constroem um quadro bem composto.
Apesar de ação não ser tão linear como gostaríamos, o sentido do filme é bastante acessível e compreensível. O grande aplauso vai para Paolo Sorrentino e para a sua mestria ao filmar. Não há uma única cena em que não se perceba a beleza do cinema. Tudo é composto com tal pormenor e exatidão, que é impossível não encontrar uma estética a que se possa apontar o dedo de negativa. Sorrentino joga com os zooms, com os planos de cima, com os detalhes como os olhos das personagens ou os seus gestos, de uma forma genial.
This must be the place é um filme pensado ao pormenor, que mistura os lados mais opostos da essência humana e os confronta na busca de um caminho que necessita ser percorrido. A isto alia uma componente visual que não pode receber outra palavra que não seja genial.
RUGGINE – 7/10
Ruggine, palavra italiana para “ferrugem”, é o nome do mais recente filme de Daniele Gaglianone, realizador presente no Festival de Veneza em 2011. Um filme denso e com uma narrativa intensa, que conta a história de um grupo de crianças imigrantes do Sul, residentes num bairro nos arredores de uma cidade do norte do país.
Fazendo um paralelo entre a infância e a idade adulta dos protagonistas, relembra vivências e experiências passadas que marcarão para sempre o percurso de cada membro da trupe. As brincadeiras no Castelo de ferro-velho, as brigas, as intrigas, os planos para assustar aqueles que os aborrecem.
Um quotidiano pacato e agradável, pautado por uma incontornável inconsciência e ingenuidade. Mas eis que, interferindo neste dia-a-dia ritmado, algo inesperado irrompe, alterando o sossegado recanto dos benjamins: o doutor Boldrini, médico da cidade, expondo toda a sua loucura e insanidade, inicia uma constante de abusos sobre duas meninas do grupo. Um calvário para ambas, incapazes de escapar à maldade e perversidade do homem, disposto a comprometer-lhes o futuro. Os resquícios desses tempos permanecem, muitos anos depois, moldando um presente desmembrado.
Monótono e solitário para alguns, os fantasmas de outrora acompanham a caminhada. Fantasmas desvairados, mas memórias capazes de imprimir uma sensibilidade ausente entre aqueles que não viveram o martírio. Um presente que se vive no passado, um passado vivido no presente.
Para sábado, dia 14, os destaques passam pela estreia de Scialla! e Corpo Celeste na secção Competitiva, por Napoli 24 em Il Documentario e Vallanzasca na secção Panorama. A Festa do Cinema Italiano espalha-se por todo o país na RTP2, onde será exibido, no âmbito do Panorama, Il Villagio di Cartone, de Ermanno Olmi, grande homenageado desta edição, pelas 22:40.
Artigo escrito por: Daniel Veloso e Wilson Ledo