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Diferentes formas de vida no doclisboa

O doclisboa começou na passada quinta-feira, dia 20, e, desde então, são muitos os filmes com sessões esgotadas, o que só faz adivinhar uma nona edição de sucesso. Crazy Horse, de Frederick Wiseman, abriu o festival com sala cheia.

O fim-de-semana trouxe consigo muitas mais sessões, distribuídas por três dos espaços do festival, Cultugest, Cinema Londres e Cinema São Jorge. Os destaques vão para a abertura da secção Heart Beat, que engloba os documentários sobre musica, e que começou com a projecção de George Harrison: Living in the Material World, de Martin Scorsese (que se dividiu em duas partes, projectadas nas noites de sábado e domingo).

Vol Special, de Fernand Melgar, Cinema Komunismo, de Mila Turajlic, Diário de uma Busca, de Flávia Castro, e In Film Nist, de Jafar Panahi e Mojtaba Mirtahmasb, foram alguns dos outros filmes que marcaram estes primeiros dias de festival. Na competição portuguesa, destaque para A Nossa Forma de Vida, de Pedro Filipe Marques, muito aplaudido pelo público.

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A Nossa Forma de Vida – 8,5/10

O que, à primeira vista, poderia parecer ter muito pouco a dizer, revela-se uma das mais belas formas de vida – a nossa, ou dos nossos. Na sua primeira obra, Pedro Filipe Marques apresenta, possivelmente, um dos mais belos filmes deste doclisboa. Intimista, divertido e cheio de amor.

A Nossa Forma de Vida mostra o dia-a-dia de Armando e Maria Fernanda, casados há 60 anos. Tudo acontece no oitavo andar do prédio onde vivem e de onde pouco saem. Armando, sempre muito trabalhador e de ideais comunistas vincados, Maria Fernanda, a dona de casa, que tanto gosta de estar à janela a observar o que se passa lá fora. O casal conversa, partilha opiniões e comenta, de forma divertida, o que de bom ou mau se passa no país, onde a crise espreita por todos os lados.

Os protagonistas não são mais do que os avós do realizador, que dedica este seu primeiro filme à mãe. A vida do casal é apresentada com muita intimidade, e o público é convidado a entrar neste quotidiano como se fosse seu, sendo-lhe impossível ficar indiferente aos comentários às notícias do jornal, ao que vêem na televisão, aos aviões que tantas manobras fazem perto do seu prédio ou ao fogo de artifício de ano novo, que tantas gargalhadas fizeram despertar.

A concorrer na competição portuguesa de médias e longas-metragens, Pedro Filipe Marques trouxe consigo um forte candidato, que conquistou o grande auditório da Culturgest. Presentes na sessão estiveram também Armando e Maria Fernanda, os protagonistas, calorosamente aplaudidos, de pé, por toda a sala.

In Film Nist / This is not a Film – 7,5/10

Inserido nas sessões especiais da selecção internacional fora de competição, In Film Nist traz até nós a realidade crua do Irão e as dificuldades sentidas pelos seus cineastas, devido às grandes limitações no que toca à liberdade de expressão.

Este documentário retracta um dia na vida do realizador Jafar Panahi, um dos mais importantes realizadores da actualidade, cujos filmes se debruçam, de forma crítica, sobre a realidade social do país. Em Março de 2010, Panahi foi preso em sua casa, sendo posteriormente condenado a seis anos de prisão. A essa pena, acresce a proibição de fazer filmes nos próximos 20 anos. Em prisão domiciliária e impossibilitado de filmar, decide contornar essa proibição, “contando” um filme que não chegou a realizar.

In Film Nist começa com a concretização da ideia inicial de “contar” um filme. No entanto, depressa Panahi percebe, com a ajuda de Mirtahmasb que o filma, que há outros caminhos a explorar neste documentário. É ao observar o dia do realizador que se compreende não só o sufoco e desespero que este sente por não poder fazer o que mais gosta – filmes -, como toda a realidade iraniana que o envolve. Não somente a censura, como a própria instabilidade e insegurança que se vive nas ruas.

Estes dois realizadores iranianos trazem até nós algo que realmente não é um filme, é sim o retracto de uma realidade dura, que comove e deixa qualquer um solidário com esta causa. In Film Nist estreia por cá a 3 de Novembro.

 Inês Moreira Santos