“Ir ou não ao Sudoeste TMN é uma decisão que não deve ser baseada no cartaz, como acontece com a maior parte dos festivais”. Haviam-me dito que o mais importante nos dias de férias na Herdade da Casa Branca é o “espírito” e tive a prova cabal logo na minha primeira experiência: um cartaz onde predominavam o soul, hip-hop e derivados não era muito aliciante, mas fui ao SWtmn e trago muito boas recordações, apesar de não ter assistido a muitos dos concertos.
A praia da Zambujeira do Mar fica a meia dúzia de quilómetros do recinto do festival e a organização conseguiu (quase sempre) evitar as filas intermináveis para apanhar os autocarros. Mergulhar no oceano não exigiu horas e horas de espera. Não experimentei o canal de água no parque de campismo mas, mesmo que fosse mau, ninguém se pôde queixar de falta de alternativa. Ponto positivo para a organização.
Já em relação à segurança, houve muitas falhas. Apesar de ser difícil distinguir os inúmeros boatos que têm corrido pelos meios de comunicação e fóruns na internet da verdadeira realidade, este festival fica marcado pela confusão. Muitos, muitos assaltos a tendas e violência. Para além disso, a notícia de uma violação, embora negada pela organização, tem-se alastrado como um rastilho de pólvora.
As dimensões do gigantesco parque de campismo podem explicar o elevado número de casos de assaltos. Nas zonas que frequentei fiquei com a sensação de que o problema não esteve no número de seguranças, mas sim na sua impotência perante a imensidão de tendas quase coladas, o que facilitou a missão dos criminosos.
Com um custo suplementar de 20€, o car camping revelou-se uma excelente opção: acampei com os meus amigos num espaço bem mais pacato do que a grande maioria dos festivaleiros e os pertences de maior valor ficaram sempre guardados no carro, estacionado ao lado das tendas.
Um cartaz que junta Snoop Dogg e Interpol, Valete ou The National tem as suas consequências: por um lado, aumentam as receitas de bilheteira, pois agrada a vários públicos; por outro, dá-se uma mistura de “tribos”, separadas por estilos muito diferentes, o que pode dar mau resultado quando há intolerância e dificuldade de aceitação da diferença.
Voltando ao “espírito” do Sudoeste: animação e divertimento exigem, para a maioria, álcool e drogas. O facto de – ao contrário do ano passado – ter sido proibida a entrada de bebidas no recinto do festival explica as fracas assistências nos primeiros concertos do dia: a festa fazia-se era no campismo, até muito tarde.
O palco Jogos Santa Casa, para além de ser o que acolheu mais vozes portuguesas, foi aquele que proporcionou momentos mais intimistas no festival. Nele actuaram, entre outros, os agradáveis Destroyer, dEUS (não mereciam o palco principal?), Zola Jesus, os franceses Nouvelle Vague com convidados portugueses e Clã (num concerto onde as crianças foram convidados especiais). O concerto de Luísa Sobral foi o que mais me surpreendeu neste palco: já conhecia o seu projecto e não duvidava de que seria capaz de dar um bom concerto, mas nunca imaginei que a audiência fosse tanta. Não sei como souberam, mas niggas, malta do hip-hop, estavam lá (é provável que tenha sido o único concerto que viram naquele palco) a apaudir e a assobiar efusivamente. Eis as vantagens de ter uns olhos bonitos. A artista, muito interactiva, confessou-se comovida.
No palco Sapo Positive Vibes reinou o reggae. Passei por lá poucas vezes. O ambiente nunca variou: música calma, boa vibe, e um cheiro que anestesiava – pode ser desagradável dizê-lo, mas a droga foi uma das imagens de marca deste festival, com particular incidência neste palco.
No palco TMN não vi nem um concerto inteiro. Sei que Snoop Dogg cumpriu as expectativas, que Kanye West provocou a discórdia (“concerto memorável” vs “eram necessários tantos efeitos vocais e tanto show off?”), que os Deolinda foram arrepiantes (estrearam mais uma música de intervenção) e que Valete teve mais público do que Interpol e (provavelmente) The National – o pessoal do Sudoeste quer é palavras de ordem. David Guetta e Swedish House Mafia, por mais explosivos e competentes que sejam, não me despertam interesse, porque reproduzem música pré-feita e não noto nenhuma diferença entre ouvi-los numa discoteca ou num festival de Verão. Para quem gosta, foram momentos espectaculares.
Scissor Sisters deram, na minha opinião, o melhor concerto de todo o festival. Provaram que não são só o reggae e o soul a proporcionar boa onda, foram bem mais humildes que Kanye West (não começaram o concerto com ar de quem se acha Deus e conquistaram o público com muito suor) e a sua música obrigava toda a gente a dançar. Ana Matronic e Jake Shears foram verdadeiros animais de palco e tiveram sucesso com aquilo que produziram em palco e não com o que a produção faz acontecer sem os artistas terem qualquer mérito.
Voltar em 2012? Ainda é muito cedo para decidir.
*Todas as fotografias usadas no artigo foram retiradas da revista Blitz e são da autoria de Rita Carmo.