Permanece a obra quando se perde o autor. Para além dos vários trabalhos publicados em vida, muitos outros permanecem desconhecidos para os leitores e seguidores de Saramago. Zeferino Coelho, o editor do autor, confirmou à imprensa que existem vários trabalhos de Saramago que serão lançados a seu tempo.
“Por entre os véus oscilantes que lhe povoavam o sono, Silvestre começou a ouvir rumores de loiça mexida e quase juraria que transluziam claridades pelas malhas largas dos véus. Ia aborrecer-se, mas percebeu, de repente, que estavam acordando”.
Assim começou o autor aquele que virá a ser o seu último romance integral a ser publicado. Clarabóia será o próximo romance de Saramago, editado já em Outubro ou Novembro. O livro, escrito no princípio da década de 50, sendo um dos primeiros do autor, apresenta uma história engraçada: foi entregue à editora, mas parece ter ficado esquecido nos seus arquivos. Quando o editor contactou, tempos depois, Saramago para a publicação, o autor já não estava interessado e nunca mostrou vontade que o publicassem em vida, autorizando-o só para depois da sua morte. O romance conta-nos a história de um prédio onde vivem várias famílias e Saramago descreve o quotidiano de cada uma delas, assim como as suas qualidades e vicissitudes.
Para 2012, está também prevista a publicação, após autorização de Pilar Del Río, das cerca de 20 páginas do romance sobre o comércio de armas e indústria do armamento que Saramago estava a escrever aquando da sua morte, denominado Alabardas, Alabardas! Espingardas, Espingardas! (título baseado num verso de Gil Vicente).
Projecta-se ainda a publicação da correspondência de Saramago com os leitores e com o seu editor Zeferino Coelho, tratando-se contudo de um projecto a longo prazo, tendo em conta o número de pessoas que estariam envolvidas no processo.
Um ano depois da morte do Nobel Português, as suas cinzas serão colocadas no Campo das Cebolas, perto da Casa dos Bicos, onde a partir de Novembro passará a funcionar a Fundação Saramago, junto a uma árvore centenária trazida da Azinhaga, de um banco de jardim e de uma placa com uma frase retirada de Memorial do Convento: “Mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia”. A cerimónia terá lugar às 11 horas do dia 18.
Mas não será esta a única iniciativa que pretende recordar Saramago no primeiro aniversário da sua morte. No dia 17, nos Paços do Concelho de Lisboa, serão apresentados, pela Caminho, os livros Palavras para José Saramago e O Silêncio da Água (que parte de um excerto de As Pequenas Memórias), bem como a reedição de Viagem a Portugal com prefácio do italiano Claudio Magris
No mesmo local, será ainda apresentado, pela Gradiva, A Última Entrevista de José Saramago, realizada em Outubro de 2009 por José Rodrigues dos Santos e que conta com prefácio da viúva do Nobel. As receitas do último revertem em parte para organizações humanitárias moçambicanas associadas ao programa da RTP apresentado por Catarina Furtado, Príncipes do Nada.
Não só ao nível da literatura será celebrada a efeméride. No dia 18, a Cinemateca Portuguesa exibirá às 21h30 o documentário de Miguel Gonçalves Mendes, José & Pilar, dando-se de seguida a sessão de lançamento do DVD e da Banda Sonora Oficial. A sessão contará com a presença do realizador e de Pilar Del Río. A banda sonora conta com vozes como Camané, Adriana Calcanhoto, Noiserv, Luís Cília e Pedro Gonçalves (Dead Combo). O mesmo documentário será exibido pela SIC em duas partes durante Sábado e Domingo à noite, por volta das 23h30.
Em Portugal, o documentário está há 5 meses consecutivos em cartaz, alcançando assim o recorde de permanência em sala de um filme português, tendo alcançado até à data 22 mil espectadores. Trata-se do quarto filme mais visto de 2010 (atingindo esta marca em mês e meio de exibição) e do documentário mais visto do ano, tendo estreado oito durante 2010. Produzido em parceria com vários países, como Espanha, o filme tem recebido honra de abertura de festivais, tem sido nomeado para alguns prémios e destacado das mais diversas formas, não só em Portugal, como também em Espanha, no Brasil e no México.
httpv://www.youtube.com/watch?v=LMFbp_t7h_A
Ao nível das artes performativas, o Centro Cultural de Belém homenageia José Saramago com o espectáculo As 7 últimas Palavras de Cristo na Cruz, com texto do autor, música de Haydn e encenação de Teresa Villaverde. O espectáculo conta com a participação da Orquestra Sinfónica Portuguesa.
Também Espanha celebrou a efeméride com o espectáculo Vozes de Mulher na Obra de Saramago, realizado no dia 14 na Casa da América, em Madrid. O espectáculo contou com Pilar Del Río, Pilar Bardem, Aitana Sánchez-Gijon e Maria Pagés.
O tempo passa, mas certos nomes não se esquecem. Um ano depois de Saramago, o país não esquece, a arte não esquece, a alma portuguesa não esquece. Depois de Saramago, Saramago.