A nova grande aposta da televisão pública tem criado controvérsia. Com pouco tempo de exibição já gerou, segundo o Jornal de Notícias, queixas na ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social) e na provedoria do telespectador da RTP.
A ideia original de Bruno Nogueira (juntar diversificadas pessoas conhecidas numa casa) tem em vista a crítica aos formatos de reality show, tão valorizados em grelhas como as da TVI. Porém, parece carecer de alguns cuidados que qualquer programa do canal público exige, nomeadamente num horário como aquele em que o programa é emitido (prime-time depois do Telejornal).
A meu ver, Último a Sair faz surgir um paradoxo. Supostamente a RTP não enquadra reality shows na sua programação, tanto pelos conteúdos como pelos valores que um programa deste género envolve. Mas quando vi a primeira emissão de Último a Sair notei que decerto os valores de produção deste não andarão longe dos de um verdadeiro programa do género. Afinal como podemos justificar tal incoerência?
Que Bruno Nogueira é o “menino dos olhos” de José Fragoso, já o espectador mais atento compreendeu, mas daí a satisfazer as suas idiossincrasias artísticas que enquadram programas pouco dignos do prime time da televisão pública, vai um longo caminho. No entanto, segundo informações a que o Espalha-Factos teve acesso, Fragoso gosta mesmo do programa e apostará, em breve, em emissões diárias do mesmo.
Tenho, em definitivo de parabenizar o humorista pela inovadora ideia, porém o espaço RTP não é de todo o seu. Interjeições reprováveis têm percorrido as emissões, em grande parte sem qualquer tipo de disfarce de sonoplastia, o que decerto contribuiu para as queixas apresentadas. Infelizmente, acredito que muitos pais estejam hoje preocupados em não permitir que os seus filhos se liguem ao canal para o qual contribuem com os seus impostos, devido a uma opção menos feliz do director de programas.
Com certeza que se Último a Sair fosse um programa de late night a gravidade do que lá é dito ou feito seria amenizada, pelo menos o público desse momento do dia já não seria composto por crianças.
Em relação a este ponto, poderemos objectar que os menores de hoje já sabem mais do que qualquer programa menos próprio lhes poderá ensinar, mas lembremo-nos também que os hábitos dos públicos se constroem, e não é decerto a servir fast food que se consegue que alguém aprenda a gostar de creme fraiche d’isigny.
A televisão pública tem esse dever. Tem o dever de oferecer todos os géneros de programas mas pensando a cada momento que o que está em causa é o dinheiro dos contribuintes (em tempos de crise ainda mais) e que, desta forma, tem de lhes apresentar algo enriquecedor.
Deixemos os excessos televisivos para as privadas e para a sua busca desenfreada de audiências. O entretenimento da RTP tem de ser ligeiro mas interessante, descomplicado mas enriquecedor. Em suma, tem de fazer jus à dignidade de ser emitido pelo canal público de Portugal.