A Disney regressa ao Pavilhão Atlântico para patinar sobre o gelo, nos dias 26 e 27 de Março. O espectáculo Disney On Ice -Um Século de Magia celebra os quase 100 anos de história e animação dedicados aos mais pequenos. É, de facto, um momento para olhar para o passado e reconhecer o que trouxe a Disney ao patamar cimeiro em que está hoje.
Em 1923, quando fundou, juntamente com o seu irmão, Roy Disney, a Disney Brothers Cartoon Studio, Walt Disney estaria provavelmente longe de imaginar que o seu pequeno estúdio de desenhos animados, em Hollywood, se tornaria o maior império de media e entretenimento, 88 anos mais tarde. Antes deste estúdio, que nos primeiros tempos insistia em não dar lucros nem sucesso, Walt já tinha tido uma pequena produtora de contos de fadas animados, a Laugh-O-Gram, e tinha já desenhado cartazes para filmes e publicidade. O desenho estava, portanto, sempre presente nas suas perspectivas de vida. Até mesmo quando conduziu uma ambulância da Cruz Vermelha, em França, com 16 anos: o carro distinguia-se dos outros pelos desenhos de Disney que o forravam.
Depois da má sorte inicial, e com reestruturações em 1928 que incluíram a mudança para o nome Walt Disney Studio, o vento pareceu mudar para a pequena produtora. Sobretudo com a criação da sua mascote, que viria a ser símbolo e ícone de gerações: Mickey Mouse. A atribuição do seu esboço, feito a partir de sucessivos círculos, não é pacífica, permanecendo a dúvida entre o próprio Walt Disney e Ub Iwerks. No entanto, aos olhos da cultura do século XX, que viu Mickey Mouse crescer, mas nunca envelhecer ou sair daquele seu estádio ingénuo, curioso, dócil e infantil, Walt Disney foi sempre o pai do pequeno rato. A forma como dialogava com ele, em programas de televisão e cartoons, era como de mestre para a sua obra-prima, como de pai para filho. Ele próprio foi a única voz conhecida de Mickey durante 18 anos.
A criação de Mickey foi a catapulta para o sucesso dos estúdios de Disney. Com a estreia da personagem nas curtas-metragens Steamboat Willie e Plane Crazy, a última técnica introduzida no cinema, o som, é aproveitada pela produtora e Mickey torna-se um êxito. Cinco anos depois, o rato já rendia mais de 600 mil dólares e a ele acabaram por se juntar Minnie, Donald, Pluto, entre outros míticos participantes dos filmes animados, mas também do imaginário de gerações.
O fenómeno Mickey viu o seu primeiro acto falhado com o filme Fantasia, longa-metragem em que desenhos animados, entre eles Mickey, davam vida e história a música clássica. Apesar de apresentar a animação, não só como forma de contar histórias, mas também como uma forma de arte, e de introduzir um novo sistema de som com diversos canais, não deu os lucros que se esperariam. Ainda assim, aquele que pareceu um flop, em 1940, tornou-se, nos anos 60, um clássico do cinema de animação, deixando para sempre a imagem, já vista por todos nós, de Mickey vestido de aprendiz de feiticeiro.
Desde a criação desta personagem, que haveria de durar até aos dias de hoje, o historial da empresa foi de altos e baixos. O desvio de dinheiro por um dos colaboradores por altura do seu primeiro Óscar, com a curta Flowers and Trees (primeiro Óscar para melhor curta de animação e, além disso, o primeiro a adicionar cor aos desenhos animados), e a Segunda Guerra Mundial debilitaram a empresa e Walt Disney viu-se na encruzilhada de vender a mesma, ganhar algum dinheiro e acabar com o sonho de uma vida, ou fazer um novo filme que tanto o podia projectar de novo, como deixa-lo na penúria. Optou pela segunda hipótese.
Assim nasce um dos clássicos Disney, em 1950: uma adaptação do conto de Charles Perrault, Cinderela. Não era a primeira vez que os estúdios Disney produziam uma longa-metragem animada. Já o tinham feito, com muito sucesso, com Pinóquio ou Branca de Neve e os Sete Anões, a mítica primeira longa-metragem de animação de sempre, que tem o mérito de conseguir, com um sistema de câmara multiplano, a ilusão de profundidade. O que Cinderela tráz de novo é o facto de ter sido o primeiro em que se apostou em música feita e produzida pela empresa, pela então recente Walt Disney Music Company. A casa crescia e tornava este filme um dos mais rentáveis do ano e, durante muito tempo, o maior êxito da Disney. A Walt Disney Studio tinha outra oportunidade para continuar.
A expansão será marcada por novos horizontes. A redistribuição dos rentáveis clássicos rende muito dinheiro à empresa e a parceria com a rede de televisão ABC, onde Walt Disney apresentou vários programas com as suas personagens, possibilita e impulsiona a abertura do primeiro parque temático da Disney. Disneylândia, na Califórnia, inaugurado em 1955, foi idealizado por Walt Disney sob os seus ideais de liberdade, diversão e ingenuidade e a partir das histórias Disney.
A verdade é que a ideia de que os sonhos e a fantasia se podem tornar realidade, transformada por Disney num parque de diversões, rendeu lucros extraordinários. Assim, seguiram-se resorts e outros parques de diversões nos Estados Unidos, e mais tarde na Europa, com a Eurodisney, em França. O pequeno sonho dos ideais americanos de felicidade, bem-estar e fraternidade, deixou de acontecer apenas em filmes criativos e pedagógicos e tornou a Disney um império milionário.
Os filmes continuaram, no entanto, a ser o grande motor. Foram lançados A Dama e o Vagabundo, Bela Adormecida, 101 Dálmatas e Mary Poppins, o primeiro a juntar actores e desenhos animados nas mesmas cenas. Com a morte de Walt Disney, em 1966, os sucessos começam a tornar-se mais raros e só na década de 1989 – 1999 a (renomeada) Walt Disney Company parece redescobrir a fórmula do sucesso que está, tão simplesmente, nos filmes de animação baseados em histórias clássicas como O Rei Leão, O Corcunda de Notre Dame, ou A Bela e o Monstro – o primeiro e, durante muitos anos, único filme de animação nomeado para o Óscar de Melhor Filme. O filme que inaugurou esta era foi A Pequena Sereia, introduzindo uma técnica de coloração dos desenhos digital que passou a ser usada nos filmes seguintes.
A introdução de disseminação de técnicas mais apuradas na animação fez-se notar em filmes como À Procura de Nemo, Cars, The Incredibles – Os Super-Herois, em que as imagens têm uma forte vertente computadorizada e ganham uma terceira dimensão muito mais marcada. O Paraíso da Barafunda, filme com sucesso pouco expressivo, chegou mesmo a ser anunciado como o último filme desenhado segundo os métodos da velha guarda. Porém, a Disney parece não ter conseguido resistir à sua fórmula de sucesso, e em 2009 sai para os cinemas A Princesa e o Sapo, um revivalismo das histórias e da estética tradicionais. Além disto, A Princesa e o Sapo parece ter o benefício de quebrar barreiras raciais ao apresentar a primeira princesa negra da história da animação.
Pode ser pueril nas suas produções, mas nos negócios não é certamente. Ao longo do seu tempo de vida, e em especial nas últimas três décadas, o incremento nas finanças da Disney permitiu-lhe absorver outras empresas e criar o maior império de entretenimento alguma vez visto. Detém inúmeros estúdios, sendo os Pixar Animation Studios os mais recentes; a maior rede de televisão americana, a ABC, entre outras; cerca de 70 estações de rádio nos EUA; estúdios produtores de música como Walt Disney Records; estâncias turísticas e parques de diversões temáticos um pouco por todo o mundo; para além dos lucros incontáveis originados pela marca Disney.
O pequeno sonho de Walt Disney de animar a vida infantil sob a égide da fantasia, da imaginação e, acima de tudo, segundo os valores americanos, foi capaz de marcar pais e filhos, fazer parte indelével da cultura do século XX, ser um gigante económico capaz de movimentar milhões e pertencer ao nosso imaginário desde que nascemos, quase de forma inconsciente. Provavelmente nenhum de nós se lembrará da primeira vez que olhou para um boneco Disney. Eles sempre estiveram presentes, nascemos com eles. E continuam a animar as nossas vidas.