Terça-Feira, dia 12, foi noite de barulho no Plano B, num evento organizado pela sempre grande Amplificasom. Tudo começou com os barcelenses The Glockenwise, mas os ânimos só se começaram a verdadeiramente incendiar à terceira música do concerto de quem todos queriam ver: os canadianos Metz. Até ao seu fim, guerrilhou-se contra a surdez. O saldo? Uma ressaca de ouvidos como nunca tinha tido.
A estória, tal como tantas outras, começou pela introdução, dada aqui pelos The Glockenwise, banda barcelense pertencente à grandiosa Lovers & Lollypops. Ao princípio, existiam casais a ver o concerto abraçados e a espalhar a cena do amor. A meio do concerto também, assim como no seu desenlace. Sem nunca terem conseguido captar toda a atenção por parte do público, foram mandando “piadas” ou aromatizando-se com os aromas provenientes dos sovacos uns dos outros mas, acima de tudo, foram fazendo jus à minha opinião acerca deles: uma banda sempre conservadora da sua postura cool, que não é extraordinariamente boa, mas é capaz, e que não traz nada de inovador à música nacional, mas que se torna interessante quando faz explodir o barulho que lá reside e que cede sempre às vocais. O concerto foi todo ele assim, e só cresceu qualitativamente nas últimas duas músicas, as faixas onde se sentiu a pujança instrumental do quarteto. Estava aberto o apetite, agora vinha aí quem todos queriam ver: os canadianos Metz.
Todos os que ali estavam não estavam, com certeza, ao acaso: todos sabiam o que esperar, todos sabiam que se estavam a meter num concerto para gente rija (podem ler a previsão do concerto aqui), todos sabiam quem eram verdadeiramente os Metz. O barulho, fruto da fragmentação de toda a loiça que por lá iria estar e/ou voar, era, por certo, a maior certeza que se alojava nas cabeças dos presentes. Mas a expectativa em vivenciar a mecanização natural e desprovida de produção da música dos canadianos era imensa, quase tão grande quanto pareceu ser a espera do trio caminhar pelo meio da plateia para, por fim, subir ao palco. Foram uns largos minutos, mas chegara o momento: os Metz subiam, finalmente, ao palco da sala intimista do Plano B.
O trio, que teve no seu homónimo lançado no ano passado o seu disco de estreia, não se fez de rogado e lançou-nos imediatamente às feras: a avalanche sonora foi prometida, mas o primeiro par de canções que foi tocado revelou-nos uns Metz menos estrondosos, barulhentos, atordoantes e bombásticos do que em estúdio – culpa da soberba produção do disco -. A promessa começou-se a cumprir à terceira música do alinhamento e, aí, já podem esquecer tudo.
A partir desse momento, o concerto foi absolutamente frenético e avassalador: cavalgava-se a um ritmo estonteante, enquanto três seres canadianos calibravam os seus instrumentos guerreiros para nos fazer explodir a cabeça, tronco e membro. As cervejas, já mortas do eterno descanso nos copos dos civis, voavam sem parar, como se de aviões de combate aos incêndios florestais se tratassem: os ânimos estavam irremediavelmente incendiados, facto bem vincado pelo mosh que se ia sentido nas filas dianteiras da sala. Não houve sangue na guerra, mas quase: um crowdsurfing falhado de uma rapariga na casa dos vinte anos, que acabou com ela estendida no chão, quase pintava aquele caos de tons encarnados.
Enquanto isso, a guerra não cedia, não estagnava, apenas se afogava em mais barulho e dilatava os contornos de todo aquele cenário cenoso: os Metz estavam a conseguir monopolizar os acontecimentos. Guerrilhou-se incessantemente na sequência fantástica Wasted, Sad Pricks e Headache. As armas? Eram várias. Mas era sobretudo da essência punk que os canadianos se muniam: a vertente “inocentemente” teatral do vocalista da banda, Alex, homem com fontes enérgicas inesgotáveis, ia esculpindo em palco aquilo que os Metz representam em 2013: trajava o mais cliché de todos os contrastes, preto-branco, esboçando, por um lado, a descrença num futuro, o desgaste em confrontar a mesmice de sempre, a falta de monotonia. Por outro lado, o branco aninhava consigo a réstia de esperança radicada na rebeldia juvenil, bem representada pelo endiabrado Alex. O tempo parecia esquivar-se dele, bem como o desgaste. Certo é que não parou sequer um segundo durante a meia hora (ou pouco mais) que esteve em palco; é necessária esta pró-actividade e inquietação para não cairmos no negrume da vida.
O concerto foi sempre assim. Não se parou um instante. Lembram-se dos casais abraçados no início? Agora esqueçam-nos. No meio daquela moshada e de várias tentativas de crowdsurfing falhadas, não havia espaço para lamechices amorosas. Havia espaço unicamente para o motivo que nos tinha levado ao Plano B: barulho. Os Metz provaram que em 2013 fazem-no como poucos, mas com a particularidade da sua música não ser unicamente noise: há punk, há hardcore, há vestígios bem fragmentados de grunge que na música dos canadianos ressuscitam, à la Bleach. O baixo distorcido, que tão visceral consegue ser em Wasted, aquele bateria, que parece só funcionar com diabos lá no seu comando, e a guitarra do incessante Alex, que faz soltar riffs monstruosamente atordoantes, levaram os nossos tímpanos a um autêntico cenário de guerra. Combateu-se contra a surdez. E nós agradecemos. Se é para celebrar época de São Valentim, sirvo-me dos meus ouvidos há horas amplamente violados para vos relatar a minha paixão pelos canadianos, pelo barulho e, sobretudo, pela Amplicasom, que tantos bons nomes traz a Portugal (Amplifest, alguém?). COM METZ, ATÉ TE EXPLODES.
*Este artigo foi escrito, por opção do autor, ao abrigo do acordo ortográfico de 1945
Vídeo: Gonçalo Loureiro
Agradecimentos ao José Guilherme Marques do canal180.